Francisco Celso Calmon
Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral - E o PT com isso?; Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula.
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8 de janeiro ainda à espera de justiça, por Francisco Celso Calmon

A conjuntura atual, de ampla conciliação, não deve ser, porém, a ditadura do esquecimento na construção do futuro

Janelas danificadas no Palácio do Planalto após atos golpistas. | Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

8 de janeiro ainda à espera de justiça

por Francisco Celso Calmon*

À medida que a população brasileira for sendo informada, vai compreender que havia um plano golpista e cuja concretização não foi alcançada porque Lula e alguns auxiliares perceberam a tempo de impedir o desfecho da intentona bolsonarista.

O plano era tosco, não havia complexidades, e possuía dois eixos.

Embora rude, o plano foi adredemente planejado. E o foi desde que montaram acampamentos em frente aos quarteis.

E por que em frente a unidades militares, se lá é área de segurança?  E o mais grave: estavam atentando contra o Estado democrático de direito à medida que pugnavam pela intervenção militar, ou seja, por um golpe.

Porque essas unidades estavam sob orientação de golpistas. Se assim não era, então, as FFAA são completamente ingênuas e vulneráveis à atentados terroristas. Um atestado de total despreparo, vergonhoso diante dos homônimos estrangeiros e um “convite” a grupos terroristas.

E a tentativa de explodir um caminhão em Brasília e os fogos na direção da sede do STF? E os desfiles intimidatórios de tanques, alguns parecendo mais sucatas, e o ensaio de revisar a história e militarizar a data da independência, que não fora obra militar.  

Tudo seguia um planejamento e contava com a não reação das forças de segurança.

Bolsonaro deu o sinal ao não reconhecer a derrota e ao não passar a faixa presidencial.

Os acampados tinham liberdade e segurança de que nada aconteceria a eles e nem aos seus atos terroristas.

Era o descampado da libertinagem sob auspício especial do Exército.

O primeiro eixo era gerar a balbúrdia, o vandalismo, o caos, de forma a chocar o público e atemorizar o governo.

O segundo eixo era, diante do quadro trágico do vandalismo, o Lula decretar a GLO, insistentemente sugerida e defendida pelo ministro da Defesa, José Múcio. Embora o ministro Dino tenha também apresentado ao presidente como uma das possíveis medidas.

Tempestivamente repelida pelo Lula, pela Janja e, talvez, outros auxiliares do presidente Lula. Felizmente!

O Presidente, entre as medidas cabíveis apresentadas pelo Dino, opta certeiramente pela intervenção na segurança do DF. E vai ocorrer de uma forma legal, sem atropelar às leis.

Afinal, os que permitiram os acampamentos e a entrada de ônibus no dia 8 até próximo da sede dos três poderes, esperavam o quê? Um piquenique, uma quermesse? Só mesmo aos olhos comprometedores de José Múcio, o ainda ministro da defesa.

Caso acionasse a GLO e uma vez as Forças Armadas no controle da capital da República, colocando ordem, parecendo os salvadores do caos, Bolsonaro e demais líderes do golpe – militares, congressistas, agentes do mercado e mídia, capitalizariam a opinião publicada de apoio aos salvadores da balbúrdia e vandalismo, alegariam fraude na eleição e incapacidade do governo eleito de pacificar o país e tomariam o poder.

O como, exatamente ainda não há informação, mas virá com o tempo, se as forças democráticas não permitirem a anistia dos golpistas e terroristas.

Diante da resistência montada, com a unidade dos três poderes, os mentores do golpe, sabedores de que os EUA não apoiariam a priori, recuam.

Não houve a queda da democracia, mas seu fortalecimento.

Passado um ano, quero crer que o presidente saiba quem foi quem nessa intentona e comece em 2024 um processo de depuração para resguardar o seu governo de pusilânimes ou mesmo traíras, mormente dos cínicos e hipócritas que o rodeiam.  

A justiça ainda claudica no indiciamento dos militares, políticos e policiais, principalmente os de altas patentes e da linha de comando da intentona.

Inclusive e de maneira especial com Bolsonaro ainda solto. Sua existência, sem processo criminal, é um risco continuado ao Estado democrático de direito, é um alento à sua corja de neonazifascistas.

Entre as descobertas do plano, havia o objetivo de assassinar o ministro do STF, Alexandre de Morais, provavelmente a de outros também, e o cumprimento da promessa já declarada há anos e sempre ratificada de matar uns 30 mil esquerdistas.

Alguns de nós poderia estar nessa lista, ou nosso filho, irmão, parente ou amigo; poderiam fazer justiçamentos em praças públicas; motoqueiros aloprados tocariam terror em bairros; sedes de partidos e de movimentos sociais poderiam ser incendiados.

Enfim, o que fizeram durante a ditadura militar e o que incentivaram e já fizeram o clã e as milicias bolsonaristas, nos leva a imaginar que a nossa vida política e mesmo a nossa existência estariam sempre em risco iminente. 

Se não houver nesta quadra política e histórica uma punição exemplar aos meliantes golpistas e terroristas, estar-se-á consolidando o DNA da impunidade do país.  

O Brasil se livrou daquela tentativa de 8 de janeiro de 2023, porém, não de conspirações e novas tentativas. 

O golpismo é um processo histórico, entre tentativas e realizações de golpes já somam onze. E a impunidade que os acompanham são fomentos a novos. 

Há nas forças armadas, particularmente no Exército, a concepção de que cabe a elas a tutela das instituições. E numa interpretação esdrúxula do art. 142 da Constituição, acham que no caso de conflito entre os poderes constituídos cabe as forças intervirem para colocar ordem.  De forma que Bolsonaro provocou de todas as formas o STF para gerar um conflito radical e baseada nessa interpretação excêntrica justificar uma intervenção militar.

As falas do general Mourão, ex-vice presidente e atual senador, são sempre nesse sentido. Com ele existem outros militares que comungam dessa fantasiosa e capiciosa concepção.

Um perigo atingir a capilaridade de jovens oficiais com essa ufanista e distorcida missão. Por isso, as forças carecem de formação democrática, à luz da história real e da Carga Magna. Cabendo aos acadêmicos, juristas e intelectuais darem cursos e palestras ao oficialato.       

Daí também a importância neste 8 de janeiro de 2024 de haver manifestações de repúdio por todos os cantos do país. E mais: que continuemos com a formação de comitês populares de luta pela defesa da democracia.

A incompleta justiça de transição, que não responsabilizou os militares, empresários e demais autores das graves violações dos direitos humanos durante a ditadura, tem na conjuntura as condições favoráveis e imperativas para completar, recriando a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, dando recursos à Comissão da Anistia, e, especialmente, com a criminalização dos retroenvolvidos pelo Ministério Público Federal.  

Para tanto, a Rede Brasil – Memória, Verdade e Justiça e mais vinte entidades lançaram um Manifesto, 12/11/2022, pela criação de uma Comissão estatal, permanente, pela Justiça de Transição, pois, enquanto não caminharmos por essa via, a democracia continuará sob um fio de alta tensão intimidando o nosso Estado de direito.  

A conjuntura atual, de ampla conciliação, não deve ser, porém, a ditadura do esquecimento na construção do futuro. (Manifesto da RBMVJ).

*Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral – E o PT com isso?, Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula. Coordenador do canal Pororoca e um dos organizadores da RBMVJ.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

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