E o Marco Archer, hein?, por Joaquim Aragão

E o Marco Archer, hein?

Por Joaquim Aragão

A discussão sobre o destino dos dois traficantes na Indonésia não tem sido muito ampla neste site. Daí, tomo iniciativa de pôr um pouco de lenha nesse fogo. 

De início, a discussão não pode se resumir em ser contra ou a favor da execução desse traficante confesso e, de certa forma, insolente. Há de se analisar em que contexto político essa verdadeira carnificina legal ocorreu. 

É de se esperar que a nossa imprensa, que não passa de um alto-falante de agencias estrangeiras de notícias, não tenha nenhum empenho, muito menos interesse, de esclarecer seu público, cada vez mais minguante, sobre a situação política de países que se encontram fora do eixo dominante, ou seja, daquilo que se convencionou chamar de “Primeiro Mundo”.

Quem aproveitar a oportunidade de querer saber um pouco mais do país que foi o primeiro a executar um brasileiro, por mais idiota que este último seja, irá se confrontar com um panorama desolador. O nível de corrupção e brutalidade e, como corolário obrigatório disso tudo, de hipocrisia, é assustador, deixando o nosso Brasil, tão conspurcado por nós e pela imprensa estrangeira que não gosta dos nossos passos um pouco independentes demais, muito para trás. 

É essencial resgatar que a Indonésia realizou em 1965 um pinochetaço muito mais violento que o Chile: mais de um milhão de pessoas foi aniquilado da forma mais brutal, em nome do anticomunismo. Evidentemente, não foram apenas os comunistas os chacinados, mas também sindicalistas, intelectuais, padres, qualquer um que tinha ousado exprimir ideais que não se conformam ao cinismo imperialista e à podridão interna. Claro, também, que esse massacre só foi à época noticiado “em passant” pela imprensa, sem nenhuma expressão de indignação, ao estilo do “Je suis Charlie”. 

A herança maldita desse crime histórico, que resta impune, continua fazendo da Indonésia um país extremamente brutal, desigual e corrupto, à beira de inúmeras guerras civis e separatistas. O pior, apesar de uma “redemocratização”, os responsáveis pelo massacre continuam no poder, festejados como heróis. Até hoje, os trabalhadores têm medo de se sindicalizar; os movimentos sociais, de protestar.

Para ilustrar a desumanidade particular desse massacre, sugiro ver o documentário “The Act of Killing”, onde um cineasta norte-americano, Joshua Oppenheimer, conseguiu a participação dos próprios facínoras, que descreveram com o maior orgulho suas façanhas. O cineasta ousou corajosamente entrevista-los diretamente, já em que a população até hoje tem medo de falar deles. Na medida em que a íntegra do documentário, obviamente ausente nas nossas telas de cinema e domésticas, ainda não está disponível, e que o trailer muito pouco reflete a dimensão da brutalidade do acontecimento documentado, sugiro assistir à discussão com o cineasta, disponível aqui (https://www.youtube.com/watch?v=hHGbb64YxAk)

No que se refere o tráfico de drogas, a hipocrisia não poderia ser maior. Entre as elites da Indonésia, as drogas circulam com a liberdade que se conhece no nosso país. Na própria prisão onde nosso compatriota idiota e executado viveu, ele pode desfrutar, melhor: comprar os mais diferentes privilégios: televisão, internet, comidas gostosas, amantes, e outros favores mais, além de…drogas!. Quem não consegue comprar, tem de passar os dez anos nas masmorras tão semelhantes ou piores às nossas. 

Mas como é necessário criar ódio, medo e sobretudo reanimar a repressão, o presente governo, particularmente direitista, resolveu endurecer, mas tendo como alvo os aventureiros free-lancer nacionais e estrangeiros, do calibre de nos dois playboys tupiniquins. Esses, pois, não estão inseridos da rede já interna de tráfico, que está incorporada ao poder. 

Prova disso é que houve recentemente uma inglesa aventureira, Lindsay Sandiford, que foi pega com drogas, mas resolveu colaborar com a polícia e a justiça (?), entregando todos os membros do cartel para qual trabalhava. Em função dessa cooperação, o próprio promotor resolveu pedir 15 anos de reclusão. Para espanto dele, da acusada e de todos, o Juiz a condenou à morte, e agraciou os chefes do cartel com penas brandas…Ou seja, é patente que o cartel denunciado estava protegido pelo sistema. 

Quanto aos nossos idiotinhas, tenho de expressar extrema consternação de que cidadãos tão privilegiados, ao invés de devolver ao País o investimento que faz neles, em forma de trabalho dedicado, inovador, resolvem, por preguiça e arrogância, jogar tudo fora, colocar irresponsavelmente suas cabeças em bocarras de jacaré, e deixar suas famílias, seus pais, irmãos e entes queridos, em situação de desespero, vergonha e quase irrecuperável tristeza…A esses últimos devemos, sim, nossa mais calorosa solidariedade!

Redação

9 Comentários

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  1. ONU condena execução de brasileiro na Indonésia

    Estranhamente, após um vasto noticiário sobre a execução de Archer na Indonésia, nem a grande mídia, nem a Blogosfera deu repercussão a uma decisão da ONU que prova quantos equívocos foram cometidos inclusive pela esquerda nessa questão. A frase “sou contra a pena de morte, mas…” tornou-se um mantra. Eis a matéria que está sendo sonegada ao público e que foi divulgada por alguns portais bem escondidinha, apesar da importância http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2015/01/20/nacoes-unidas-condenam-execucao-de-brasileiro-na-indonesia.htm

  2. Nassif
    Não sei se é pra rir

    Nassif

    Não sei se é pra rir para não chorar. No Brasil acontecem 150 execuções diariamente. São 54 mil assassinatos por ano. Não vejo nenhuma movimentação para mudar essa situação. Hipocrisia e a mentira são as marcas registradas no nosso país.Quanta alienação….!!!…..

  3. “É essencial resgatar que a

    “É essencial resgatar que a Indonésia realizou em 1965 um pinochetaço muito mais violento que o Chile: mais de um milhão de pessoas foi aniquilado da forma mais brutal, em nome do anticomunismo.”

    É bom lembrar que na época o PC indonésio era o maior do mundo fora o chinês e soviético. Isso no quarto país em população do mundo. Para os yankees era insuportável a possibilidade de ascenção dos comunistas ao poder. A Indonésia era governado por Sukarno, herói da independência. O curioso é que o país  foi colonizada pelos holandeses, portanto, fora dos ingleses e franceses de sempre.

    Foi o regime ditatorial de Suharto(mentor do massacre de 1965)  que comandou em 1975 a invasão do Timor Leste recem libertado de Portugal e impos o terror na região.

    O filme “O ano em que vivemos em perigo” dirigido pela australiano Peter Weir(Sociedade dos poetas mortos) se pssa no cenário do golpe de 1965. O filme foi censurado durante todo o regime de Suharto.

    Como vemos, Indonésia não é só Bali.

  4. Só registrando

    O documentário “O Ato de Matar” está à disposição para os assinantes da Net no Now!, sem custo adicional. Procurem em “programas de TV”, e “HBO”.

  5. Mundo cão!

    Pois é!

    É triste ter sido inocente para acreditar que os países do mundo fossem todos seguros o suficiente para qualquer loucura da juventude!

    É triste ter ficado 10 anos preso nas masmorras de um país de trogloditas!

    É triste ter sido condenado por juizes togados mais cagados que os nossos!

    É triste ter sido executado num paredão perfurado dolorosamente por balas de fuzis!

    É triste entrar para história como o primeiro brasileiro executado no exterior!

    Melhor seria estar nas estastísticas brasileiras, como o surfista do Embaú, do que ter esta morte inglória em selvagens terras estrangeiras, sem nenhuma clemência possivel, sem ninguém para chorar seu destino…

  6. Marco Archer

     

    The Lemon Juice King

    Marco Archer e Kathryn Bonella

    “Usei drogas no Brasil por um longo tempo. Beto, meu amigo, me colocou neste negócio quando eu ainda era um garotinho. Ele me usava para obter cocaína, mas não para o tráfico: ele é usuário. Ele me levava ao fundo da favela, parava o carro longe, e dizia: ‘Vá!’. Então eu caminhava em torno de 20 minutos, para percorrer todo o caminho até o topo do morro com a minha mochila, passando por ​​20 policiais portando armas perigosas. No topo do morro eles chamavam: ‘Menino, o que você quer? Preto ou branco?’ (preto era a maconha e o branco era a cocaína). ‘Eu quero branco!’ ‘Ooh, bom menino…’ Eu dizia: ‘Eu quero cocaína!’. Merda – nunca usei cocaína – eu era um garoto… uma criança… eu só levava a minha lancheira e descia com uma carga de cocaína para o meu parceiro.”

    Não demorou muito para que Marco passasse a fazer muito mais do que encher a sua lancheira. Começou a voar em paraglider com apenas 14 anos, e rapidamente percebeu o seu talento natural. Aos 16 anos estava competindo internacionalmente, em Bogotá, fazendo a sua primeira viagem ao exterior, visitando a Colômbia, dominada por Pablo Escobar. Marco venceu a cpmpetição e voltou para casa com um troféu de ouro nas mãos e, em suas calças, a “Branca de Neve”.
    “Beto me disse: ‘Marco, leve isso’. Então eu cheguei de volta ao Brasil junto com mais sete pilotos de vôo livre, um troféu de campeão e 100 gramas de cocaína na minha cueca e ninguém verificou qualquer coisa… “

    Para Marco a situação era perfeita: traficar drogas deu-lhe os meios para voar e voar deu-lhe o passe livre para o tráfico. Ele foi catapultado para um estilo playboy de vida. A sua carreira no tráfico comercial começou em sua segunda viagem ao exterior, quando foi para a América, aos 17 anos. 
    “Acredite em mim, quando eu fui para a Califórnia ‘um Pablo Escobar’ – um chefão, que comanda a venda de drogas no Brasil e ao redor do mundo – veio para mim e disse: ‘Marco, me escute agora: você vai para a América e eu tenho muitos amigos na América, com movimentações internacionais, onde você pode ganhar mais dinheiro’. Eu levei 3 quilos pela primeira vez, de maneira fácil. O outro ‘Pablo Escobar’ usou a minha asa-delta. 
    Eu competia em todo o mundo e sempre trazia narcoba. Eu levava a cocaína para a América, para a Itália, para a Espanha, para Portugal, Suíça, Alemanha, Austrália; para todos os lugares. Eu sou campeão brasileiro, então quando me viam, eles verificavam, mas realmente não checavam nada.”

    Pela primeira vez o tráfico proporcionou a Marco o seu próprio dinheiro e deu-lhe a liberdade para voar – ele costumava subir aos céus do Rio, às vezes até 3.000 pés – tão alto que a famosa estátua do Cristo Redentor desaparecia abaixo dele. Às vezes voava com 10 ou 20 amigos por perto para bater um papo, antes de mergulhar entre as nuvens, como um deus; com muita adrenalina nas veias e muita paz no coração. Antes de saltar, muitas vezes, para curtir a onda e aliviar o medo, ele fumava um baseado. “Ooh, é melhor que você pode imaginar… dá uma sensação muito boa, se você fuma um baseado para voar. Uau! Eu sempre fumava e voava. Fumo e voo, você sabe, é como uma meditação. Você sabe que eu voei em muitos lugares em seu país. Eu voei em todos os lugares por lá: Adelaide, Stanwell Park e Byron Bay na Gold Coast. Eu voei em todos os lugares… competindo, eu voei por 12 anos e sempre levava um pouco de cocaína.”

    Excerto do livro ‘Snowing in Bali’ de Kathryn Bonella com imagens da Internet

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