Políticas sociais: os respiradores do capitalismo, por Albertino Ribeiro

O capitalismo que Marx examinou com seu estetoscópio não tinha muitos anos de vida, porém as impensáveis políticas sociais para a sua época ainda o mantém vivo e livre de convulsões.

Políticas sociais: os respiradores do capitalismo

por Albertino Ribeiro

Roberto Campos disse ter sido um profeta melhor que Marx. Segundo ele, “Marx previu o fim do capitalismo; ele, o fim do socialismo”.

Contudo, Campos não fez um diagnóstico que explicasse o motivo pelo qual o capitalismo ainda não tenha encontrado o destino preconizado pelo economista alemão.

Segundo o economista e escritor Robert Heilbroner, o diagnóstico de Karl Marx foi perfeito, pois a forma conservadora como o sistema funcionava naquela época, principalmente na Inglaterra, não havia outro destino possível.

Ciente da lógica interna do capitalismo, o futuro apareceu para Marx de forma clara e inequívoca, pois ele conhecia como ninguém o pendor que o sistema possuía para produzir instabilidades e concentração de riqueza.

Era impensável que houvesse na época algum movimento do governo de qualquer nação no sentido de reduzir as desigualdades sociais; era ponto pacífico que a economia deveria ficar entregue a si mesma apesar das injustiças sociais.

Até mesmo Marx, que tanto repetiu Hegel ao dizer que a semente do contraditório já existe na tese, não poderia prever que os países capitalistas, como última solução, recorreriam a sua contradição para salvar o próprio capitalismo.

Após 46 anos do falecimento do filósofo, o mundo capitalista enfrentou a maior crise de sua história e todos pensaram que o momento derradeiro havia chegado.

Realmente o fim teria chegado se não fossem as ideias “fora da casinha” do economista Inglês John M. Keynes, que levou o mundo a repensar o papel do estado na sociedade.

Anos depois a própria Inglaterra, que no século XIX era a caricatura de um capitalismo predador e desumano, criou no pós-guerra um sistema universal de saúde.

Hoje, vários países da Europa são bem-sucedidos com a parceria estado e mercado. Os nórdicos, por exemplo, possuem um alto índice de desenvolvimento humano graças as suas políticas de distribuição de renda.

A Noruega em 2017 pagou 21 bilhões de dólares – 5,3% do PIB – em benefícios sociais para 20% da população, mesmo tendo na época um governo conservador. Disso, podemos depreender que as políticas sociais estão inseridas em um capitalismo que se reinventou para sobreviver.

Destarte, o capitalismo que Marx examinou com seu estetoscópio não tinha muitos anos de vida, porém as impensáveis políticas sociais para a sua época ainda o mantém vivo e livre de convulsões.

Muito mais agora, em tempos de pandemia, essa realidade torna-se inexorável, inclusive, já se discute a possibilidade de implantar um programa de renda básica no Brasil – futuros respiradores do capitalismo.

Roberto Campos não foi um profeta melhor que Marx, aliás, nem mesmo foi um profeta porque, mesmo sendo contemporâneo de países europeus ricos e praticantes de políticas sociais, insistiu na velha cantilena inspirada em um capitalismo reacionário e moribundo.

Redação

1 Comentário

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  1. O “erro” de Marx foi supor que a luta de classes levaria à superação do capitalismo por meio dos operários, quando ela, na verdade, significou a democratização do capital. Pois a pressão do trabalho sobre o capital, acabou por resultar, em tempos de crescimento, em políticas de distribuição de renda e amparo social social que, como Keynes notou, fortalece o capital ao impulsionar o consumo das massas. O capitalismo não seria derrubado pela apropriação do capital pelo trabalho – isto na verdade fortalece o capital.

    Mas há um outro Marx, o da lei do valor-trabalho, que descobriu que a contradição fundamental do capitalsmo não é entre capital e trabalho, mas sim entre o trabalho humano e a crescente automação da produção de valor, principalmente a industrial. Este Marx afirma que tanto os trabalhadores quanto as elites sofrem a coerção da lei do valor. Que o mais valor (lucro) só advém do trabalho humano mas que este é, contraditoriamente, cada vez mais substituído por máquinas, ocasionando uma tendência de desvalorização do valor, que se expressa no mundo real pela queda tendencial da taxa de lucro, empiricamente verificável e que se encontra em níveis baixíssimos atualmente.
    O resultado é:
    – Necessidade de se produzir mais e mais mercadorias para manter o nível de lucro, acarretando crise ecológica;
    – Desemprego estrutural por conta da automação generalidade da produção de valor (na indústria e, agora, no setor terciário)
    – aumento da exploração do trabalho dos que ainda estão empregados, para compensar a queda do lucro;
    – criação de capital fictício na forma de dívidas que nunca serão pagas para compensar os baixos lucros da “economia real”
    O capitalismo não será superado pela luta de classes, mas certamente irá colapsar por contra das contradições internas da lei do valor – já está acontecendo. Este Marx da lei do valor-trablaho ainda está vivíssimo.

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