Inconstitucionalidade flagrante na independência do Banco Central, por Carlos Frederico Alverga

O BC uma entidade componente da administração pública federal indireta, sendo a autoridade monetária uma autarquia especial.

do ConJur

Inconstitucionalidade flagrante na independência do Banco Central

Por Carlos Frederico Alverga

Para que haja chance de êxito da política econômica, é necessário que haja convergência entre as políticas fiscal e monetária, pois ambas devem seguir o mesmo direcionamento para contrabalançar os efeitos do ciclo econômico. Na fase expansiva, para conter eventual inflação, deve a política fiscal ser contracionista com elevação da tributação e contenção dos gastos públicos, e a monetária deve ser restritiva, com taxas de juros mais altas. Na fase recessiva do ciclo econômico, quando pode ocorrer desemprego, aí a política fiscal deve ser expansiva, com redução da tributação e expansão dos dispêndios públicos. Aí, no caso, a política monetária deve ser expansionista, com taxas de juros mais baixas para estimular o investimento e o emprego, aquecendo a demanda agregada.

É praticamente impossível implementar uma política econômica coerente e consistente sem que o governo exerça o controle sobre as duas variáveis macroeconômicas mais importantes, o câmbio e os juros. Da mesma forma, é necessário que haja uma gestão unificada, harmônica e convergente das políticas monetária e fiscal.

A questão da independência do BC (Banco Central) esbarra numa inconstitucionalidade flagrante, pelo fato de ser um assunto que se refere, na verdade, à organização administrativa do Poder Executivo da União, tendo em vista ser o BC uma entidade componente da administração pública federal indireta, sendo a autoridade monetária uma autarquia especial.

Esse assunto é de iniciativa exclusiva do presidente da República para projeto de lei ordinária, sendo, também, cabível tratar esse tema por medida provisória. Com efeito, é assim que dispõe o preceito constitucional contido no artigo 61, § 1º, II, alíneas a, c, e, conforme transcrito a seguir:

“São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: (…) II – disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; (…); c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (…); e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI.”

Conforme a alínea por último citada, e adotando o magistério da eminente administrativista Di Pietro, tal mandamento da Carta Política pode, por analogia, ser estendido às entidades integrantes da administração direta, autárquica e fundacional, tais como o BC.

Equivocadamente, considerou-se que este assunto seria referente ao sistema financeiro e que, por conseguinte, teria que ser objeto de lei complementar, sem que houvesse iniciativa exclusiva neste caso, o que permitiu que sua autoria fosse de um parlamentar federal. Além disso, sendo matéria de Lei Complementar, não poderia ser modificada por Medida Provisória. Entretanto, como se trata de matéria atinente à organização administrativa de entidade autárquica integrante da administração pública federal indireta, não se trata de caso de lei complementar, conforme já explanado, sendo tópico de lei ordinária de iniciativa exclusiva do presidente da República. Tal Lei Complementar que concedeu a independência da autoridade monetária foi objeto de ação de controle concentrado/abstrato de constitucionalidade perante o STF mas, surpreendentemente, a Corte Suprema não considerou que tal normativo fosse inconstitucional formal e materialmente, apesar de o ser, conforme demonstrado.

Agora, com a instituição da nova regra fiscal, tem-se a adoção de uma metodologia em que, de modo geral, a expansão da despesa pública ficará no máximo em 70% do aumento da receita pública (no caso de o resultado primário ficar no intervalo entre as bandas), mas, para isso, a receita tributária do governo precisa aumentar. Para que isso ocorra, é necessária a revitalização da atividade econômica, a qual é inviável com juros tão elevados como no patamar atual. Confiar na reforma tributária, fortemente caracterizada por conflitos políticos e federativos, é extremamente temerário.

A queda dos juros seria a alternativa mais viável, mas como fazê-lo não possuindo o controle da política monetária, e diante de uma autoridade monetária hostil à retomada do crescimento econômico, que descumpre reiteradamente as metas de inflação estabelecidas e também os objetivos de suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego?
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Carlos Frederico Alverga é economista graduado na UFRJ, especialista em administração pública pelo Cipad/FGV e em Direito do Trabalho e Crise Econômica pela Universidade de Castilla La Mancha (Espanha) e mestre em Ciência Política pela UnB.

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Redação

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