Zanin vota contra o marco temporal e lança nova tese sobre indenização a ocupantes de terras indígenas

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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Com os votos de Mendonça e Zanin, o placar agora está 3 x 2 contra o marco temporal. Questão da indenização ganha mais destaque

Ministro Cristiano Zanin participa da sessão plenária. Foto: Carlos Moura/SCO/STF

O ministro Cristiano Zanin votou, na tarde desta quinta-feira (31), em sessão no Supremo Tribunal Federal (STF), contra a fixação da tese do marco temporal na repercussão geral do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, retomado nesta quarta (30) com o voto do ministro André Mendonça. 

Zanin acompanhou o relator, ministro Edson Fachin, no que tange a rejeição ao marco temporal, mas abriu discordância a respeito da indenização, onde o ministro entende ser necessário conciliar outros artigos da Constituição Federal para abarcar casos que estejam além da indenização a ocupantes de boa-fé. 

Isso não significa que Zanin acompanha a tese sugerida pelo ministro Alexandre Moraes, da indenização prévia por terra nua no âmbito da repercussão geral – que tem o apoio dos ministros Nunes Marques, André Mendonça e hoje ganhou o de Gilmar Mendes.

Para Zanin, é preciso analisar caso a caso, não sendo uma regra estabelecida para qualquer situação – tal como se decidirá com relação ao marco temporal. 

O ministro argumentou dizendo que é preciso observar a responsabilidade civil do Estado para com todos os ocupantes de terras indígenas que terão de sair porque seus títulos são declarados nulos, conforme a Constituição Federal.

Por isso, para o ministro, que a análise não pode ter efeito vinculante no Recurso Extraordinário com repercussão geral: cada caso será diferente, pode haver grilagem, por exemplo. Também disse que o governo brasileiro precisa se organizar para garantir as indenizações e as demarcações.

Opiniões prévias

Juristas que acompanham o julgamento falaram de modo preliminar com o GGN. Um deles está no Plenário do STF e o outro acompanha pela TV Justiça. Os comentários são preliminares, podem se alterar, mas a princípio ambos entendem que a tese do marco temporal se encaminha a ser rejeitada. 

O que está em jogo agora é saber se haverá maioria para discutir a indenização no atual julgamento, o que se encaminha para que sim, e qual a natureza da indenização, sendo que hoje o ministro Gilmar Mendes, durante à parte no término do voto de Mendonça, afirmou ser a favor nos moldes propostos pelo ministro Moraes. 

https://www.youtube.com/watch?v=p47v1mBhYEc

Ambos juristas ouvidos acreditam que a proposta de indenização de Zanin não leva em consideração que o processo continua sendo para reconhecer a tradicionalidade da ocupação indígena. Em outras palavras, o modelo de indenização pode virar arma anti-indígena.

Isso significa que um juiz pode entender que não se deve desintrusar, ou seja, retirar os ocupantes não-indígenas, sem a indenização prévia. Por sua vez, ela dependerá do orçamento da União, que precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional, cuja bancada ruralista pode criar dificuldades para tal.  

Outro ponto é que o governo federal poderá rever o Decreto 1775/1996, que regulamenta o procedimento demarcatório do início ao fim, e nele colocar como etapa a indenização prévia por terra nua. Na opinião dos dois juristas ouvidos pelo GGN, isso pode paralisar por completo as demarcações gerando conflitos, não pacificando. 

Como fica o julgamento

Com os votos de Mendonça e Zanin, o placar agora está 3 x 2 contra o marco temporal. Ainda votam Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e a presidente do STF, Rosa Weber.

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Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

1 Comentário

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  1. Zanin proferiu um voto juridicamente impecável que valoriza a modernidade da Constituição Cidadã. Não é mais possível restaurar os padrões violentos empregados nos séculos XVI, XVII e XVIII para justificar a expansão interna do país mediante a desumanização e o extermínio ou expulsão dos indígenas de suas terras. Aliás, nesse momento é indispensável respeitar os direitos dos índios. Eles são os únicos capazes de preservar a natureza, algo que os grileiros e garimpeiros não têm nem interesse nem conhecimento para fazer.

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