A Farsa Jato e a “disciplina da quebrada”, por Armando Coelho Neto

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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A Farsa Jato e a “disciplina da quebrada”

por Armando Rodrigues Coelho Neto

Consta do anedotário brasileiro que um chefe arrogante e estúpido ao chamar um subalterno às falas, disse – o senhor é um ignorante, sequer sabe escrever. “Olha só esse número três que o senhor escreveu. Parece um cinco”! E o empregado, humildemente, respondeu: “mas chefe, isso é um cinco”. Eis que o superior, com a autoridade de um oficiante da Farsa Jato, retrucou: “E então? Por que parece um três? Bem naquela do velho ditado, não adianta explicar quando o ignorante não quer entender.

“É só isso, não tem mais jeito, boa sorte, acabou…”. Esse trecho de canção, interpretado por Vanessa da Mata, ficou como chiclete em minha mente, quando um delegado federal corrupto resolveu tecer ironias ao golpe Cunha/Temer/Serra/Obama, apoiado pelo coronelismo da TV Globo e os demais panfletos golpistas. Para ele, a rigor, nem é só isso e nem acabou. Temos que esperar pra ver, a maravilha “que viria por intermédio dos americanos”.

Ser delegado federal é ter um pé, ainda que indiretamente, na marginalidade. Com o dedão do pé direito nessa seara, um coitado me confessou ter votado no João Dória, porque “a musiquinha ficou na minha cabeça e como o voto não vale nada mesmo, ‘na hora agá’ tasquei um 45”. Belo efeito do troque o marketing pelo marqueteiro, pois São Paulo só quer coisa  nova – ainda que seja Aécio, Kassab, Dória, embora a luz divina nos tenha dado o Haddad.

Ainda com o pé na marginalidade, o não marginal (ainda) disse que seu “assunto já está na disciplina da quebrada e que  vão resolver numa boa”. Para quem não sabe, o “disciplina da quebrada” é uma figura do Primeiro Comando da Capital (PCC), que interfere nas ameaças de “infirmeza dos brother”. Para quem não sabe, o PCC é uma organização criminosa que nasceu em São Paulo, que cresce, floresce e acontece sob os auspícios de uma outra quadrilha maior.

Essa outra quadrilha integra os fios invisíveis que movem o Estado de São Paulo. Nem a Polícia Civil nem Federal chagam perto. Os ditos poderes constituídos não interferem e qualquer esforço de desavisado parlamentar para investigá-la não anda. Ela pode tudo, faz tudo, comete crimes e destrói provas sob o auspicioso silêncio dos arautos da liberdade de imprensa e da moralidade. O coronelismo eletrônico, viés central do golpe, não chega nem perto.

É nesse contexto que a Farsa Jato em sua perseguição implacável ao que chamam de quadrilha e, propositadamente, impõe a ideia de que quadrilha e partido político é a mesma coisa, fez com que quadrilheiros passassem a chamar petistas de petralha. Enquanto isso, o PT está aí bem comportado, seguindo as regras burguesas da Constituição que não assinou e que aqueles que a assinaram já a jogaram no lixo. Cinicamente, a ex-suprema corte (propositadamente com letra minúscula) diz que para novos tempos, novas soluções.

Como Kassab e Doria, os tempos não são novos e as soluções idem: autoritarismo, elitismo, golpismo descarado contra um povo anestesiado – a quem sequer podemos culpar. O crime de imprensa não mais existe, pois a imprensa é o próprio crime, diante de um PT acovardado, que com um pé na ilegalidade, optou pela legalidade, quando paradoxalmente vive diuturnamente o inverso.

O Partido dos Trabalhadores ainda não assimilou que as brilhantes e legalistas retóricas de Dilma Rousseff (Fora Temer!) e José Eduardo não valeram e nem valem. Não adianta a imprensa internacional dizer que é golpe. Afinal, até para o delegado federal da musiquinha não é golpe. Foi “tropeço na democracia” ( Lewandowski), mas como um bandido, comemora na bocada o produto roubado, solta um sonoro  “perdeu playboy”!

O quase marginal lá de cima foi vítima de uma quadrilha. Como não acredita em voto nem em justiça, ele recorreu ao “disciplina da quebrada”, que já colocou o “nome do cara no livro”. Agora, ou vai ou racha e o “conselho da quebrada já se reuniu lá no Parque Dom Pedro e deu o ‘salve’”.

Volto ao chefão lá de cima. Se para a Lava Jato, conforme conveniências o três parece um cinco  e se Lula diz que é cinco perguntam por que parece um três, o caso já deveria ter ido (ou subido) pro “disciplina da quebrada”. Mas, Lula está com “o nome no livro”. Eis uma questão complexa num pais de incompreensões de metáforas.

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

11 Comentários

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  1. A Farsa Jato e a “disciplina da quebrada”

    Mais um bom texto a clarear os bastidores do golpe.

    Diria, apenas, que dentro dos velhos tempos medidos desde 1500, uma fresta se abriu e por causa dela mais um governo eleito foi derrubado ilegalmente.

    É de se reconhecer que por mais de 12 anos tivemos um período de avanços sociais, na inserção do Brasil na área internacional e por tudo, um Brasil maior.

    E justamente por isso temos agora uma reação brutal, cínica e entreguista.

    No jargão “tá tudo dominado”.

    Como já dito, em algumas instituições, se colocar uma lona por cima é circo,  meia luz é lupanar – sem ofensa  às profissionais – e se estourar foguetes por perto é venda de drogas. Esse último o mais provável pois compra e venda é o que mais se pratica.

    O que me parece é estar havendo um acirramento das posições. um endurecimento nas ações que só poderá resultar em mais violências de parte a parte.

    Em alguma hora alguem irá pagar para ver.

     

  2. A nossa zelite zelote é

    A nossa zelite zelote é bizarra…e parafraseando o Nassif: este pais será aquilo ela (zelite zelote) quer que sejamos..,..e o que quer essa gente quer senão que nos tornemos um país atrasado, quintal dos EUA, deve ser mais cômodo não existir enquanto nação forte e soberana…deve ser mais cômodo nos guiarmos pelo padrão Casa Grande vs Senzala ao invés de sermos um grande pais de classe média sem abrirmos mão da existência de uma elite ou seja a classe A, sim, seria possivel conviver com este duas realidades, mas essa zelite zelote prá lá de bizzarra atrasada ignara optou pelo caos..,..agora é a lei do salve-se quem puder….

  3. É duro passar atestado de

    É duro passar atestado de burro, mas li e reli o texto e não entendi a quem o brilhante articulista se refere, no tocante á quadrilha maior. Também entendo que há de se tomar cuidado, mas viajei totalmente, se alguem puder elucidar, agradeço. Nenhuma crítica ao articulista, que leio sempre, pela clareza do texto e profundo conhecimento de como funciona o estado brasileiro.

  4. NÃO É CINCO E TÃO POUCO 3 É UM, É O LULA.

    Se realmente tivéssemos uma constituição valendo para todos o que aconteceria com como a justiça e seus desmandos e com a arapongagem suicida de crédito, e o que estaria os punindo e de que forma? O negócio não é corrupção, o negócio é LULA, os amigos da corte podem roubar à vontade. Gostaria também de saber se na constituição fala-se de excepcionalidade. O certo é, no Brasil não existe mais leis valendo e justiça, existe um misto de paspalhice e o cuidado do meu e de meus amigos. O pior é que a gente caçoava dos paraguaios, mas aqui é pior, é um Paraguai multiplicado.

  5. No MP do Paraná havia
    No MP do Paraná havia seguidores do Olavo de Carvalho que morou em Cutitiba antea de ir.embora, este Olavo de Carvalho era amigo de Guilherme Afif Domingos. A caça ao PT pode ter suas raizes aí.

  6. O xis da questão

    Venho matutando nisso:

    “Enquanto isso, o PT está aí bem comportado, seguindo as regras burguesas da Constituição que não assinou e que aqueles que a assinaram já a jogaram no lixo(…)”

    “O Partido dos Trabalhadores ainda não assimilou que as brilhantes e legalistas retóricas de Dilma Rousseff (Fora Temer!) e José Eduardo não valeram e nem valem. Não adianta a imprensa internacional dizer que é golpe.”

    “Foi “tropeço na democracia” ( Lewandowski)(…)”

    Quem passou para o mi-mi-mi, ou sempre esteve, são os contrátirios ao golpe. Que nada fizeram, a começar da presidenta. Só fizeram reclamar e dizer: vocês não podem fazer isso, e se fizerem é golpe!

    Somente falar não resolve nada. Enquanto os “intelectuais, constitucionalistas e defensores do estado democrático de direito” permanecem nas discusões, os golpistas fazem e acontecem e ao final, o que vivemos hoje passará para a história como  uma vitória para o país, pois a história sempre é contada pelos vencedores.

     

     

     

  7. Mum pais de incompreensões de metáforas… e interpretação

    Excelente artigo, cronista Armando Coelho Neto. O jornalista Leonardo Sakamoto diz em seu livro que faltam duas coisas ao brasileiro: amor e interpretação de texto. Totalmente de acordo.

  8. O “disciplina”

       Firmou o nome do Lula no livro, agora só falta os antena cumprirem o estatuto do conselho, sem arreglo ou mocagem.

       Pelo menos, nas paradas o “1533” ( O Partido ) tem regras claras, estrutura de comando definida, atua na direta, não embaça.

  9. Excelente !!!
    Armando,

    Continue com sua fina ironia e trovejante sarcasmo ! Fosse capazes de ler o que escreveram ou entender o que leram, os membros do stf (aí incluído aquele que fala com sotaque e intonação de viscondessa velha, o Barroso), o excutivo, nossos probres-diabos com diploma de congressistas leriam seus textos escondidos, nos banheiros, nas “quebradas ou até mesmo no buraco de onde jamais deveriam ter saído. Talvez, mesmo em um grau infinitesimal, alguma mudança começasse a rastejar em direção à completude.

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