A inacreditável discussão sobre a meta fiscal, por Luís Nassif

Não sei quanto tempo mais será necessário para que essa irracionalidade seja rompida. Certamente não será no governo Lula

É uma discussão infindável sobre algo absolutamente irrelevante. Não existe ainda meta fiscal, porque a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) sequer foi apresentada. O que Lula propõe apenas é, em lugar de meta 0, meta de 0,25%. Se o déficit chegar a 1%, ainda assim será perfeitamente superável. Não há um único grande player internacional preocupado com a questão fiscal brasileira. Só a mídia.

Não se está falando em 4, 5, 6% de déficit nominal. Mas em um espaço entre 0 e 0,25%, ou, no máximo 0,5% do PIB.

Mas, na mídia, virou tema único. Alega-se que a receita fiscal está caindo. Claro que está e em razão da debilidade da economia brasileira, fruto direto das taxas de juros praticadas pelo Banco Central. Mesmo com essa queda, na pior das hipóteses o déficit fiscal é perfeitamente financiável.

A dona de casa consultada pelo Elio Gaspari tem que gastar conforme o seu orçamento. No setor público, gastos significam melhoria no nível de atividade econômica – portanto, gastando mais, pode-se ganhar mais receita fiscal, informação que a dona de casa esqueceu de passar para Gaspari.

Com essa discussão estéril, perde-se de vista até a missão da ciência econômica. O papel da economia é trazer desenvolvimento e bem estar geral. 

Vamos a alguns números básicos, para se conferir a irracionalidade dessa discussão.

Em 2022, o PIB brasileiro foi de R$ 9,9 trilhões. O Estado respondeu por R$ 3,1 trilhões, ou 31,2%, E esse percentual foi essencial para garantir o crescimento do setor privado.

Na outra ponta, segundo o Banco Central, os juros da dívida pública corresponderão a 7,7% do PIB em 2023. Ou seja, R$ 700,8 bilhões para pagar os juros da dívida, um aumento de 11,9% em relação a 2022. 

0,25% de déficit público = R$ 25,75 bilhões
0,5% da taxa Selic = R$ 40,1 bilhões

0,5 ponto percentual da Selic equivale a um aumento de 0,40% da dívida pública, ou R$ 40,1 bilhões em 12 meses. Já um déficit primário de 0,25% em 2024  equivale a R$ 25,75 bilhões. Meros 3,7% do total consumido por juros da dívida, e muito menor que o impacto de 0,5 ponto da Selic.

Não há nenhuma lógica nisso, não há ciência econômica que explique essa loucura. No entanto, aceita-se passivamente, como se fosse um dado científico, imutável. Trata-se de puro terraplanismo, sustentado exclusivamente por um ideologismo raso, que, desde o Plano Real, absorve todas as energias do país.

  • O que aconteceria se, em um leilão, o Tesouro resolvesse reduzir a taxa Selic? Haveria três possibilidades:
  • O investidor aceitaria, devido à segurança e à liquidez do título.
  • O investidor não aceitaria e levaria o dinheiro para papéis privados. Se a transição for feita com cuidado, poderia ir até para fundos de infraestrutura de longo prazo, como ocorreu no curto período em que Dilma Rousseff conseguiu reduzir a Selic.
  • Compraria dólares e tiraria do país.

Haveria impacto nos dólares, porque não entrariam mais dólares e parte dos investidores iria se defender adquirindo dólares no mercado. A economia seria afetada, então, pelas variações do câmbio.

No fundo, todo esse sorvedouro de recursos depende exclusivamente da ampla liberdade de entrada e saída de dólares do país, um movimento que beneficia exclusivamente o capital especulativo. O capital produtivo exige estabilidade cambial, para poder estimar com segurança o retorno do investimento. Pode-se estimar o retorno em reais. Mas uma variação cambial altera totalmente qualquer cálculo de retorno.

Não sei quanto tempo mais será necessário para que essa irracionalidade seja rompida. Certamente não será no governo Lula, a menos que apareça novamente o maior dos estadistas brasileiros, o Senhor Crise.

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Luis Nassif

3 Comentários

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  1. SIMPLES NASSIFÂO,PAUTA DIVERSIONISTA,ENQUANTO ISSO SE VAI METADE SO PIB PAGO AOS ESPECULADORES FINANCEIROS SERÁ PRECISO UMA ATITUDE LITERALMENTE “ENERGÉTICA”DO GOVERNO FEDERAL,É INCRÍVEL Q CONVENCEM O PAIS PRA RETROCEDER TIPO A LAVAJATO ACABANDO.COM AS EMPRESAS NACIONAIS E MUITOS EMPREGOS E AINDA A IMPRENSA CORPORATIVA DEFENDENDO ELA,AGORA A QUESTÃO DOS ATIVOS ESTRATÉGICOS SENDO PRIVATIZADAS A PESSOAS PRIVADAS ISSO VAI E ESTÁ FAZ TEMPO.PREJUDICANDO A NOSSA ECONOMIA,OS NOSSOS EMPRESÁRIOS TUDO.VAI ENCARECER E PIORAR E JÁ ESTÁ PROVADO,SÓ FALTA TOMAR ATITUDES POR PARTE DE TODOS OS SETORES DA NOSSA SOCIEDADE EXECUTIVO,LEGISLATIVO,POVÁO NEM TUDO PODE SER TRANSFORMADO EM PRODUTO ESPECULATIVO DE LUCRO EXORBITANTE EM DETRIMENTO DE UMA NAÇÃO TODA QUEM PERDE É O EMPREENDEDOR Q MONTA UMA FÁBRICA,LOJA,RESTAURANTE INCRÍVEL ISSO TUDO NA NOSSA CARA E ESTAMOS INERTES AINDA ACHANDO Q O MERCADO SALVA,SALVA QUEM ?…!!!

  2. No fim de todas as contas o resultado é o mesmo: a economia brasileira não cresce o suficiente. E como nenhuma economia cresce por geração espontânea, o crescimento é consequência das ações praticadas em função do mesmo; tem-se isso aí. Discussões estéreis e muitas vezes inúteis, somente para distrair um público com essas tolices como comparar o orçamento publico com o de uma Dona de casa. Esse incentivo ao nada, fartamente remunerado pelo País, provoca essa disputa pela arrecadação das receitas do Estado. O gasto será maior dedicado a pagar juros ou cumprir o ofertamento do serviço público. Pouco mais de vinte e cinco bilhões de reais, se isso fosse comparado com as expectativas existentes sobre como estaria o pib do País nesse início dos anos dois mil e vinte – que alguns imaginaram estar acima de 20 trilhões de reais – , certamente a preocupação seria outra. Porque o País ficou tão abaixo disso. Provavelmente não foi por causa de questões fiscais, de uma meta zero. A discussão está bem acima disso. A expectativa que o Brasil precisa ter não é a de cumprir ou não a meta fiscal zero.

  3. Não vejo irracionalidade. O sistema quer retirar do governo brasileiro o máximo possível de dinheiro através do endividamento público.
    O endividamento público no governo bolsonaro, foi uma grande conquista alcançada pelo mercado financeiro, e agora, eles, com o controle do Banco Central querem usufruir ao máximo da posição de fraqueza e endividamento que eles próprio cavaram nos governos Temer e Bolsonaro; aumentando o máximo possível a taxa selic.
    E foi o que fizeram; a taxa de juros da dívida pública (selic) é a maior do mundo.
    Eles foram craques nisso; e a imprensa tem papel fundamental nessa empreitada, de formar dissuadir e persuadir a opinião pública enganando sobre a situação.
    E de quebra; faturam politicamente jogando a culpa no governo Lula. Que é a cereja no bolo.
    A imprensa e o Mercado Financeiro formaram então essa quadrilha, que no controle do Banco
    Central estão roubando (em valores) centenas de assalto iguais aquele famoso do túnel
    do BAnco Central em Fortaleza.
    São bandidos. E os economistas do país, toda classe, está calada ou não tem voz em
    lugar nenhum (me parece que são bolsonaristas e aceitam esse crime).

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