Roger Agnelli e a síndrome da maçaneta azul

Coluna Econômica

A indicação de Murilo Ferreira para a presidência da Vale marca o fim de um período brilhante de personalismo, a era Roger Agnelli, que, ao contrário das loas tecidas pela mídia, muitas vezes fugiu das boas práticas corporativas.

Roger era um executivo paradoxal. De um lado, gostava de se cercar de executivos sêniores. De outro, promovia um jogo interno de desgastes em torno de picuinhas, manobrado especialmente por Carla Grasso, diretora executiva de recursos humanos.

Na Vale ficou famosa a fábula da maçaneta azul.

Contavam que Roger incumbiu um diretor de comprar um terreno, juntar com outro, erguer um shopping, depois um hotel, com taxa de retorno de 15% ao ano. O diretor saiu a campo e tempos depois anunciou que cumprira a missão.

E Roger:

– Mas você colocou maçanetas azuis nas portas, não podia. Tudo errado!

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FoieFoi esse estilo confuso de Roger, egocêntrico, essa mistura de pensar grande e exercitar picuinhas, que acabou afastando vários diretores sêniores da companhia.

Roger não era o gestor que escutava, delegava e cobrava resultados finais. Não deixava os executivos tomarem decisões. Muitas vezes Carla contratava consultorias com a finalidade expressa de avalizar os pontos de vista de Roger.

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Com isso, a Vale acabou perdendo vários quadros de primeiro nível.

José Lancaster era dos maiores geólogos do mundo. Sozinho, descobriu quatro, cinco jazidas. Sua natureza era de evitar conflitos. E, para evitar, acabou saindo da Vale deixando em seu lugar um segundo competente, mas não do seu nível.

Ex-Secretário do Tesouro Nacional, Fábio Barbosa ganhou renome como o melhor executivo de finanças do país. Articulou a parte financeira da compra da Inco, conseguiu montar sistemas de captação campeões. Também não resistiu

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Vindo da presidência do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico s Social) Demian Fioca tinha três diretorias debaixo dele. Com oito meses, ganhou mais cinco. Acabou não suportando, saiu, a diretoria foi extinta e o lugar ocupado por Carla, a mais inexpressiva dos executivos da Vale, quase uma ajudante de ordens de Roger para missões de desgastar executivos.

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Processo semelhante aconteceu com Murilo Ferreira. Executivo sênior da Vale, além de diretor executivo da companhia era o único a ostentar o título de CEO – no caso da Inco, a empresa canadense de níquel adquirida pela Vale que, embora faturando menos, era muito mais complexa de gerir que a empresa-mãe..

A operação da compra da Inco foi um primor.

Ferreira foi o líder do projeto de compra conseguiu liberar vários obstáculos de natureza institucional, regulatório, em um país com sociedade civil atuante, como o Canadá.

Como primeiro CEO estrangeiro da companhia, Murilo tinha enormes desafios pela frente, a representação institucional da companhia, o segundo maior negócio da Vale. Mesmo assim, ficava isolado no Canadá, com pouca estrutura de apoio.

Por duas vezes pediu demissão e Roger insistiu para que ficasse. Na segunda, não suportou e foi embora, vitimado pela síndrome da maçaneta azul. 

Luis Nassif

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