Sobre legislação e crimes financeiros

Comentário ao post “Um país indefeso ante o crime organizado

Nassif,

A velocidade dos crimes contra o sistema financeiro, sobretudo com o advento da internet, requerem uma reestruturação do código penal e das leis extrapenais. Talvez fosse o caso de adotar a “Common Law” para determinados crimes financeiros.

As leis são lentas demais para consolidarem as práticas criminosas que mudam rapidamente e se adaptam as novas tecnologias. Quando uma lei consegue filtrar todas as novas condutas criminosas, eis que surgem outras e aí a Lei, que antes era moderna, já se tornou obsoleta.

Vale lembrar que a Lei contra lavagem de dinheiro foi sancionada pela própria Dilma Rousseff em Julho do ano passado (http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12683.htm)

Como combinar a lei com a prática? Dá para ter uma legislação de longo prazo no que diz respeito a crimes financeiros e sermos ágeis nesse aspecto?

O jogo de empurra-empurra entre Ministério da Justiça, Ministério da Fazenda e os Estados mais ajudou do que atrapalhou o processo, pois isso permitiu que a organização ganhasse tempo na sua gestão fraudulenta. A coisa é séria e lesou mais de 1 milhão de consumidores. Além disso, R$ 300 milhões foram pelo ralo com essa brincadeira de mau gosto.

Alguns temas devem ser seriamente debatidos na blogosfera, no mundo político e jurídico:

1) Se um crime financeiro que lesou pessoas em dois ou mais estados, deixa de ser competência estadual para ser automaticamente competência federal, com apoio dos Estados no que couber;

2) A inércia do MF e do MJ não se justifica do ponto de vista legal. Primeiro que a CF/88 nos Arts. 21 e 22 já diz claramente que a competência sobre esse tipo de matéria é da União (Governo Federal). O rol de atribuições está descrito nos incisos VIII do Art. 21 e VI, VII, VIII, XIX e XX do Art. 22. Como o MJ e o MF são órgãos da União, logo é competência da União cuidar dessa organização;

3) Independente de quem seja a matéria, inicialmente, todos os órgãos federais (Receita, Susep, CVM, Polícia Federal, MPF) devem entrar no circuito, dentro do rol de competências e no desenrolar do processo, afunilar para qual órgão compete a tarefa;

4) Instituir ferramentas de controle prévio ou concomitante dos crimes contra o sistema financeiro, e não deixar estourar quando a coisa toma proporções gigantescas como o caso da TelexFree;

5) A inércia dos dois ministérios também não se justifica do ponto de vista da doutrina penal, pois nesse caso o principal lesado pelo crime da TelexFree é o próprio Estado, que teve sua competência usurpada por um agente particular, em malefício daqueles que arquitetaram o esquema. O titular do bem lesado, em primeiro lugar é o próprio Estado e na sequência as pessoas que entraram nessa fraude;

6) Instituir um sistema de Polícia Federal rápido e eficaz, combinando diversas frentes – criminais, financeiras, cibernéticas, etc.

Hoje, nem a PF, nem a Receita possuem braços suficientes para averiguar todos esse crimes. Por quê então não se cria uma Polícia Financeira, responsável por crimes dessa natureza? Por quê não se transforma a própria Receita Federal, com a estrutura já existentes, e estende seus poderes para uma polícia judiciária, com poder de investigação, prisão e trâmites processuais específicos?

A PF possui um efetivo de 15 mil homens para cobrir todo o país em todas as frentes: financeiros, aduaneira, portuária, fronteiras. O número é insuficiente. Guardadas as devidas proporções, os EUA possuem um efetivo de mais de 900 mil agentes de segurança pública federal, para uma população de 312 milhões de pessoas.

É preciso discutir essas questões e tomar medidas imediatas. Do contrários, surgirão outras “TelexFree” para darem o golpe em sonhadores.

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador