Raridade: a histórica Lúcia Branco tocando o Scherzo No.3 de Chopin

Áudio inédito de Lucia Branco (1903-1973) interpretando o Scherzo No.3 de Chopin, em sua residência no Rio de Janeiro, em 1949

Reprodução

Do Instituto de Piano Brasileiro – IPB

Lucia Branco tocando o Scherzo No.3 de Chopin em casa (Rio de Janeiro, 1949)

Esta é a primeira gravação a vir à tona da grande pianista Lucia Branco, elo entre Franz Liszt e algumas gerações de pianistas brasileiros. Na década de 1920, ela estudou na Bélgica com Arthur De Greef, que fora aluno direto de Liszt, e poucos anos depois afastou-se dos palcos para se dedicar exclusivamente ao magistério. Entre seus alunos estão algumas das maiores personalidades do piano brasileiro, como Nelson Freire, Arthur Moreira Lima, Jacques Klein, Jean Louis Steuerman e Tom Jobim.

Sabia-se que no dia 15 de outubro de 1949, ela fez uma breve e última reaparição como pianista, participando de um programa na Rádio Roquette Pinto em que proferiu uma palestra intitulada “Chopin, o poeta”, em homenagem aos 100 anos de morte do compositor, e na qual ela ilustrou algumas peças ao piano. É possível que esta gravação tenha existido, mas até o momento não foi encontrada.

Porém, uma novidade surpreendente apareceu: Sandra Branco, neta de Lucia Branco, nos informou que ela tem em sua posse 3 fitas-rolo do acervo de sua avó, que ela preservou quando esta faleceu em 1973. Nas fitas havia a indicação de seriam gravações de festas de aniversário e de formatura de seu filho Sergio.

Sandra enviou as 3 fitas ao IPB para serem digitalizadas, e, para nossa surpresa, entre os áudios das reuniões familiares, havia um(a) pianista interpretando o Scherzo No.3 com grande maestria, em casa. Começamos então o processo de busca para confirmar se poderia ser a própria Lucia Branco, o que resultaria em uma descoberta extraordinária para o piano brasileiro.

Em primeiro lugar, notamos que se tratavam de fitas originais, e extremamente antigas, datadas de 1948 e 1949 – são as fitas mais antigas que já trabalhamos até o momento. Além disso, 1949 é o ano em que sabemos que Lucia Branco realizou aquele programa na rádio, e o fato de ser uma obra de Chopin também corroborava a suspeita de que seria ela estudando em sua residência para este evento. É possível perceber que se tratava de alguém praticando em casa sozinho. Por meio de uma busca em nossos arquivos, descobrimos que o Scherzo No.3 fazia parte do repertório de Lucia desde pelo menos 1924, quando ela o tocou em Paris em 5 de março de 1924. Também notamos a grande maestria com que a obra estava sendo interpretada, similar aos grandes mestres do passado, como Moriz Rosenthal e Eugen D’Albert, da escola Liszt. Por fim, recorremos a Arthur Moreira Lima e a Jean Louis Steuerman, que estudaram com Lucia Branco, para que opinassem. Ambos nos disseram que sentiram a presença e a personalidade de Lucia, que reconheceram o som de seu Steinway americano, e algumas características técnicas e interpretativas condizentes com o que ela ensinava. Eles também ressaltaram que D. Lucia não costumava tocar para os alunos, então ouvir esta gravação foi motivo de grande emoção para eles – Arthur também acrescentou que se lembra de sua professora fazendo gravações em fitas-rolo. Sandra nos confirmou que ela tinha um aparelho de fita-rolo em casa, em um móvel próximo ao piano.

Com isto, ficou claro para nós que se tratava de fato de uma gravação inédita de uma das maiores pianistas e professoras brasileiras.

Nossos imensos agradecimentos a Sandra Branco por permitir que o IPB digitalizasse e divulgasse esta preciosa gravação de sua avó.

Dedicamos esta descoberta a seus ex-alunos Nelson Freire (in memoriam), Arthur Moreira Lima e Jean Louis Steuerman.

Digitalização de Lautaro Wlasenkov para o Instituto Piano Brasileiro.

Imagem: foto de Lúcia Branco presente no acervo de Maria Helena Bittencourt Neiva, com dedicatória manuscrita datada de 1948, e doada ao IPB por seu sobrinho Gustavo Tavares.

Curadoria e pesquisa: Alexandre Dias

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Redação

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