Os crimes de Gilmar Mendes, segundo os autores da denúncia

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil
 
Jornal GGN – Gilmar Mendes cometeu crimes junto à Lei Orgânica da Magistratura, ao Código do Processo Civil e à Lei do Impeachment por três motivos: atuação político-partidária ilegal, ao articular com o senador Aécio Neves (PSDB-MG) a aprovação da lei de abuso de autoridade; por julgar causas com a defesa do advogado Guilherme Pitta, membro do escritório de sua própria esposa; e por desrespeitar com ataques membros do Ministério Público Federal (MPF), ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e o próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
 
As considerações são do constitucionalista e professor da Universidade de Brasília (UnB) Marcelo Neves, do ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, e outros 29 representantes do Direito e Universidades, que enviaram contra o ministro Gilmar Mendes três peças para o seu afastamento do Supremo: um pedido de impeachment ao Senado, uma reclamação disciplinar ao STF e uma “notitia criminis” ao MPF.
 
Ao GGN, Marcelo Neves explicou como o ministro e presidente do TSE infringiu diversas leis e regulamentações da magistratura, que se caracterizam como crime de responsabilidade. “O primeiro é exercício ilegal de atividade político-partidária que fere tanto a Constituição, como a Lei de Organização da Magistratura, como também o artigo 39 da Lei de Impeachment”, introduziu.
 
A alegação é com base nos autos de Aécio Neves (PSDB-MG), alvo de denúncia da Procuradoria-Geral da República, que traz uma conversa grampeada do parlamentar com o ministro do STF: “O senador Aécio Neves pedia para ele cabalar votos do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) [para angariar votos favoráveis à lei de abuso de autoridade]. [Gilmar] não só respondeu que ia fazer isso imediatamente, cumprindo de certa maneira uma função partidária, mas disse também que já tinha falado, convencido e persuadido dois senadores, o Tasso Jereissati (PSDB-CE) e o Antonio Anastasia (PSDB-MG). Isso claramente é atividade político partidária”, lembrou.
 
O constitucionalista ressaltou, ainda, que os senadores Anastasia e Flexa Ribeiro são investigados criminalmente no Supremo, onde Gilmar tem, ainda, um poder maior de influência, que se configuraria em conflito de interesses. “Outro aspecto da atividade político-partidária são os encontros frequentes com o Temer”, somou Neves.
 
O segundo argumento levantado nas peças enviadas ao Senado, STF e PGR para afastar Gilmar é a sua atuação em casos nos quais o ministro deveria se declarar suspeito ou impedido de julgar, mas não o fez. Além do amplamente divulgado caso do empresário Eike Batista, que não foi sequer arrolado pelos constitucionalistas, outros mais graves indicam o crime de responsabilidade.
 
Explicou que ainda que a esposa de Gilmar, Guiomar Mendes, trabalha no escritório Sergio Bermudes, do advogado do empresário Eike Batista, o caso específico não tinha atuação do mesmo advogado. Por outro lado, outros casos conflitam o novo Código do Processo Civil, de que o ministro não pode julgar quando a parte seja cliente do escritório de seu cônjuge.
 
“Há dois casos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em que o advogado Guilherme Pitta, que é do escritório da esposa do ministro, atuou em dois processos em recursos aceitos por Gilmar, que foi o relator do caso. Gilmar era objetivamente impedido. E o juiz que é impedido ou suspeito para julgar e julga, apesar disso, está desrespeitando a lei de impeachment, praticando crime de responsabilidade”, completou Marcelo.
 
O terceiro fator diz respeito à postura do ministro, “incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. O constitucionalista admite que a caracterização insere-se em “termos vagos”, mas que, ainda assim, tanto a Lei da Magistratura, quanto o Código de Ética da Magistratura delibera sobre os limites de atuação de um juiz.
 
“Um dos aspectos fundamentais é tratar com urbanidade, tratar de forma polida as partes, os colegas, os membros do Ministério Público, as instituições da República. Qualquer forma de ataque, agressão às Instituições e às pessoas envolvidas no processo é vedada.
 
“E ele fere, chama o colega Marco Aurélio [ministro do STF] de ‘velhaco’, por uma decisão. Também é incompatível com a dignidade do decoro e a dignidade do cargo criticar, fora dos autos, os processos dos colegas. Ele não só critica, ele agride os ministros, os membros do MP, agride o Tribunal Superior Eleitoral, dizendo que é ‘um laboratório do Partido dos Trabalhadores’, agride a PGR e seus membros, imputando a eles crimes. Tudo isso foge a qualquer razoabilidade para um magistrado. Qualquer magistrado que fizesse um centésimo do que o Gilmar já fez, principalmente neste último período, ele já estaria fora da magistratura”, lembrou.
 
Com base nesses argumentos, o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles e o professor da UNB entraram com um novo pedido de impeachment ao Senado. O primeiro foi arquivado pelo então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), no último ano. Agora, os constitucionalistas acreditam ter sustentações suficientes não apenas para a peça no Congresso, como também junto à PGR e no próprio Supremo.
 
Na última instância, foi dirigida uma reclamação disciplinar que, em tese, deveria ser encaminhada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Entretanto, o CNJ não pode julgar membros do STF, uma vez que está subordinado à Corte. A falta de regulamentações para fiscalizar um ministro da Suprema Corte foi um dos empecilhos aos autores dos pedidos, que tentaram contornar a situação: “Não havendo um órgão para julgar por falta disciplinar o ministro do STF, nós entendemos que o Supremo tem que decidir isso.”
 
Junto à Procuradoria-Geral da República o pedido foi específico: para que o MPF também considere Gilmar Mendes coautor das acusações que recaem contra Aécio Neves, uma vez que a conversa grampeada integra os autos da denúncia contra o senador como prática de obstrução à Justiça. 
 
“O procurador-geral da República, Janot, quando denunciou Aécio por corrupção passiva e por obstrução à Justiça, incluiu como objeto dos fatos que deram razão para a denúncia a ligação com o Gilmar. Se ele Aécio foi também denunciado por esse fato, não seria Gilmar um coautor? O princípio da coautoria”, explicou Marcelo Neves.
 
Ao contrário do que ocorreu em setembro de 2016, quando Renan arquivou os primeiros pedidos de impeachment protocolados contra Gilmar, desta vez, o receio dos autores é de que as peças, tanto no Senado, quanto no STF, sejam proteladas e simplesmente não analisadas. Isso porque o presidente da Casa Legislativa não poderá repetir a atuação monocrática de Renan, já que compete à Mesa do Senado receber o pedido de denúncia e, se assim decidir, arquivar. 
 
Por outro lado, caso qualquer uma das três instituições – seja o Ministério Público, o Supremo ou o Senado – acatar os argumentos de Marcelo Neves, Cláudio Fonteles e outras 29 assinaturas, Gilmar será afastado. 
 
“Se for aceita a denúncia [no Senado], condenado por crime de responsabilidade, ele é destituído do cargo e perde também o direito de exercer funções públicas. Se for pelo Supremo, que é puramente disciplinar, não é judicial, ele vai tem uma aposentadoria compulsória com proventos proporcionais. Se for pelo crime comum, ele também perde o cargo, pela gravidade do crime”, explicou o professor da UNB.
 
 
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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

6 Comentários

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  1. Gilmar está abalado

    Eu assisti ao vídeo em que Gilmar faz uma palestra num evento da Lide do Dória, em Pernambuco (está no youtube).

    Minha avaliação é a de que Gilmar está abalado psicologicamente. Sua performance foi medíocre (como já fora no discurso do TSE em que mudou de posição para inocentar Temer).

    Em geral ele tem uma agressiva verborragia para defender suas posições e esculhambar com os adversários. Mas nesse vídeo pode-se observar que ele tem uns “brancos” no seu raciocínio; faltam-lhe palavras adequadas que “quebram” sua explanação; não consegue ser nem enfático, nem convincente; a metáfora ao final da apresentação tem uma construção muito mal feita.

    Por ter ficado escancarado o seu envolvimento com Temer e Aécio, Gilmar demonstra sentir-se fragilizado.

     

  2. Ninguém pode estar acima da lei

    Ninguém pode estar acima da lei. Muito menos um juiz. Que seja aplicada a lei contra o Min. Gilmar Mendes. Ou estaremos dando a ele liberdade de humilhar ainda mais o nosso já frágil sistema de justiça.

  3. Outros casos
    Chamou quem participou das vaquinhas pra pagar as muitas impostas a petistas no mensalão de ladrões

    Mentiu no episodio do grampo sem audio

    Deu HC pulando instancias na satiagraha

    Chamou presidente “as falas’

  4. O rei do habeas corpus

    Se tivessem cassado o Gilmar Mendes quando ele concedeu habeas corpus ao médico Roger Abdelmassih, que fora condenado a 278 anos de cadeia, por violentar 37 mulheres e abusar sexualmente de outras tantas, nada disso estaria acontecendo em nosso país.

  5. Todo mês

    Todo mês, toda semana, todo dia, jusristas constitucionalistas fazem uma listas de injflações cometidas por este sujeito, e o que acontece,   A B O L U T A M E N T E      N A D A, a saída dele passará primeiramente pelo senado onde lá quase todos estão nas mãos dele, sabe qd ele vai parar de cometer esses crimes? N U N C A  ou então qd ele se aposentar.

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