O que foi a Nakba?, por Luis Felipe Miguel

A Autoridade Palestina hoje aceita a solução de dois Estados. Mas Israel não quer mais saber. Quer tomar todo o território para si.

O que foi a Nakba?, por Luis Felipe Miguel

A ideia de estabelecer um Estado judeu na Palestina data do final do século XIX. As sucessivas perseguições sofridas na Europa tornavam atraente a ideia da constituição de um “lar nacional” em que os judeus estivessem seguros.

Esse lar seria na região de que, muitos séculos antes, o povo judeu havia sido expulso. Um esforço migratório levou, ao longo da primeira metade do século XX, milhares de judeus para a Palestina.

Ao final da Segunda Guerra Mundial, sob o impacto do Holocausto, a Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu colocar a ideia em prática, como uma forma de reparação. A Palestina era, então, um protetorado britânico.

O plano previa o estabelecimento de dois Estados, um árabe e outro judeu, e a gestão internacional da cidade “sagrada” de Jerusalém.

Os judeus, que consistiam em um terço da população, ficariam com pouco mais da metade do território, incluindo as terras mais férteis.

O plano da ONU não foi aceito pelos árabes. Ele desconhecia a população que já vivia na região e recusava um princípio basilar da carta das próprias Nações Unidas: a autodeterminação dos povos.

Antes mesmo do fim do protetorado britânico, milícias terroristas, sob a liderança de David Ben-Gurion, começaram a expulsar palestinos de suas terras. Quando, em 14 de maio de 1948, a independência de Israel foi proclamada e eclodiu a primeira guerra árabe-israelense, acelerou-se o processo de limpeza étnica que gerou 750 mil refugiados e apagou do mapa cerca de 500 cidades e vilarejos palestinos.

A esse processo se chama “Nakba” – catástrofe.

Passaram-se 75 anos. Israel continua com sua política de apartheid e limpeza étnica, anexando novos territórios e submetendo os palestinos a condições inumanas de vida – como em Gaza.

A Autoridade Palestina hoje aceita a solução de dois Estados. Mas Israel não quer mais saber. Quer tomar todo o território para si. Quer eliminar o povo palestino.

As atrocidades do Hamas – grupo que Israel incentivou e financiou, como forma de criar cizânia e minar a liderança palestina laica – são uma triste resposta às atrocidades contínuas cometidas contra a população de Gaza e os palestinos em geral.

Benjamin Netanyahu faz parte de um povo que sofreu tudo o que sofreu, que foi vítima de um genocídio sem precedentes. Que ele se disponha a replicar, contra outros, os métodos de seus algozes, e que encontre tantos aliados nessa tarefa – isso é algo que tira nossa fé na humanidade.

Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de O colapso da democracia no Brasil (Expressão Popular).

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