Prisão de Bolsonaro pode transformá-lo em mártir como a facada de 2018, alerta pesquisador

Em entrevista ao GGN, Alexandre de Almeida, do Observatório da Extrema Direita, analisa as implicações do ato de bolsonaristas na Paulista

Jair Bolsonaro. Foto: Agência Brasil
Jair Bolsonaro. Foto: Agência Brasil

Acuado pelas investigações da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe de 2022 e outros crimes, Jair Bolsonaro e seus aliados reúnem apoiadores na Avenida Paulista (SP), na tarde deste domingo (25), para demonstrar força política e esquentar os motores para a corrida eleitoral deste ano.

Sob risco de prisão em flagrante se atacar o Supremo Tribunal Federal ou qualquer um de seus ministros, Jair Bolsonaro deve fazer um discurso mais moderado. É o que aposta o antropólogo e pesquisador do Observatório da Extrema Direita, Alexandre de Almeida.

Em entrevista exclusiva ao GGN, Almeida alertou que a prisão de Bolsonaro neste momento de furor entre seus apoiadores radicalizados poderia transformá-lo em mártir, o mesmo efeito político da facada que recebeu na eleição de 2018.

“A ideia de que Bolsonaro pode sair do preso no domingo seria de uma exploração midiática gigantesca por parte desse grupos, porque recai novamente na construção da figura do líder. Ter a passagem pela cadeia é prova de martírio. Isso é fundamental para a construção de um discurso mobilizador”, disse Almeida.

Apesar da aposta no discurso mais moderado de Bolsonaro, Almeida ressalva que os manifestantes e os políticos que compartilham o palanque com o ex-presidente neste domingo (25) podem endurecer o discurso contra o Supremo e inflamar ainda mais a hora bolsonarista.

A expectativa é de que a prisão de aliados de Bolsonaro na operação Tempus Veritatis, as falas de Lula sobre a ação de Israel em Gaza, o caso da Ilha de Marajó e outros que mobilizam as redes sociais bolsonaristas, sirvam de catalizador para que os discursos sejam mais inflamados.

Leia a entrevista completa abaixo:

GGN: O que esse ato promovido por Bolsonaro representa para a democracia brasileira e o que esperar dele?

Alexandre Almeida: É um ato que, seguindo o que a Constituição determina, pode ser realizado. Não há um impedimento que possa evitar esse evento. [O que espera dele] Vai depender muito dos próximos desdobramentos, porque a política funciona com uma velocidade muito rápida. A manifestação se propõe a defender o estado democrático de direito, mas vamos ver como se isso se dará.

Alexandre de Almeida é professor da especialização de Educação em Direitos Humanos da Universidade Federal do ABC. Foto: Observatório da Extrema Direita.

GGN: O ato pode ser considerado uma afronta ao Supremo, diante das investigações da Polícia Federal que mostram que os ataques de 8 de janeiro foram uma evidente tentativa de golpe? 

Almeida: É um ato de enfrentamento, de marcar uma clara posição. A direita está voltando às ruas e parece que será uma manifestação com bastante gente. Tudo vai depender também do que será dito ali, se é uma manifestação com a finalidade de defender o estado democrático de direito. Outra coisa é que esses políticos, esses organizadores não controlam as pessoas que vão até lá. Já vi isso em muitas manifestações. Inclusive, as que contam com a presença dessas personalidades. Não há um controle das pessoas que estão ali, as pessoas vão ali pedir as suas demandas. Eu apostaria que, certamente, vão ter ataques ao Supremo. Vai ter uma tentativa de fiscalização por parte dos organizadores, para evitar esse tipo de fotografia em manchete de jornal. Mas, não sabemos como pode acabar, até porque temos pessoas do primeiro escalão do governo sendo ouvidas pela polícia, sendo presas, há um processo de unir essas pessoas e suas responsabilidades e puni-las, a gente não tinha visto isso antes. Eu acho que também tem a questão das pautas do dia [que podem inflamar o público]. A fala de Lula sobre o Holocausto vai ser muito explorada nessa manifestação, até porque é uma direita brasileira simpática à direita de Israel. Outros temas estão surgindo, como o caso da Ilha de Marajó. São elementos catalisadores dessa massa, que pode se comportar de forma contrária àquilo que a organização espera.

GGN: Como estão as redes bolsonaristas na véspera do ato? Há notícias dando conta de que grupos estão falando em guerra civil. O Observatório tem monitorado esses grupos?

Almeida: O que o Observatório mapeou até agora é que tem o pessoal mais exaltado, que fala de um enfrentamento, “é preciso enfrentar o Supremo Tribunal Federal”. Nas redes sociais das principais personalidades bolsonaristas, todas estão chamando para o evento. Toda essa rede virtual de apoio ao bolsonarismo ela está se mobilizando. Mas não é somente um ato em defesa do Bolsonaro, há outros elementos em questão, como a eleição municipal. Essa manifestação na Avenida Paulista também serve como palanque, palco para pré-candidato. É lá que eles irão fazer seu discurso, e tentar ganhar votos [para criar] um partido conservador. Já anunciaram que vão levar 200 mil fichas de apoiamento do partido.

GGN: Considerando que Bolsonaro está inelegível, qual você diria ser o objetivo do ato?

Almeida: Sim, é especialmente uma ideia de tomar a rua. Sem dúvida, o uso da internet nas eleições é importantíssimo, ela muda cenários, não é algo que deva ser desprezado. Mas tomar as ruas é importante. Isso faz parte da cultura de diversos campos políticos, estar nas ruas e nessas manifestações. De figuras que são pré-candidato a vereador a deputado estadual. Há diversos aí nessa manifestação, para além da defesa de Bolsonaro. Mas para Bolsonaro, é sim uma manifestação para marcar posição. Para ele dizer: ‘Olha, estou estou aqui me defendendo. Estou sendo perseguido’. Faz parte da construção desse mito político do líder. Essa ideia de um um líder perseguido injustamente, essa é a narrativa.

GGN: O STF já sinalizou que se Bolsonaro atacar algum ministro ou a instituição no domingo na Paulista, sairá de lá preso. Como você acha que vai ser o tom do discurso de Bolsonaro?

Almeida: Em 2022 [quando esteve em ato na Paulista], Bolsonaro atacou diretamente o Supremo. Acho que dessa vez ele será mais moderado. Acho que há um grupo de apoiadores pedindo uma certa moderação. Dizendo para pensar que esse ato ele também é uma plataforma para próximas eleições. Jornalistas que apoiam Bolsonaro andam dizendo que o importante agora é constituíram eleitorado para eleger mais senadores em 2026, o máximo possível, para garantir uma forte presença do setor conservador do campo político, até porque o Senado tem um forte papel nas votações de impeachment de presidente da República. Para ministro do Supremo, são eles [senadores] que fazem a sabatina.

Além disso, a ideia de que Bolsonaro pode sair do preso no domingo seria de uma exploração midiática gigantesca por parte desse grupos, porque recai novamente na construção da figura do líder. Ter a passagem pela cadeia é prova de martírio. Isso é fundamental para a construção de um discurso mobilizador.

GGN: Então Bolsonaro pode se tornar um mártir? Isso pode afetar a democracia ou render mais atos a favor dele?

Almeida: É possível sim. É possível sim, e nós tivemos o exemplo em 2018, quando ele levou a facada. E agora começa a circular nas redes que Adélio [Bispo, preso pela facada] será solto. Outro tema que pode ser explorado em discursos na manifestação de domingo. Bolsonaro talvez não seja pessoalmente tão incisivo nessas questões, porque deve ser moderado, mas claro as pessoas que estão lá no palanque podem verbalizar isso, e ele não tem controle sobre as pessoas. Então essa é a ideia de um mártir. A narrativa de perseguição por parte do sistema judicial é excelente para ele.

GGN: Em seu discurso, Bolsonaro pretende abordar três grandes temas: as políticas de seu governo, a ‘perseguição’ que alega estar sofrendo e o futuro do País. Como interpretar essa estratégia?

Almeida: Faz parte dessa narrativa de construção do líder, né? É um líder que defende um legado. Qual é esse legado na fala dele? Por exemplo, que foram quatro anos sem a ameaça comunista. Com a volta do Partido dos Trabalhadores, vai bater em algumas teclas como, por exemplo, o caso da Ilha do Marajó [leia mais aqui]. Eles vão dizer: ‘olha, a gente avisou’. Vai um pouco para esse caminho, de defender legado. E a fala de futuro do país é sempre um futuro catastrófico com o PT. É só o caos, a destruição e miséria. Isso faz parte do discurso populista.

GGN: Como o bolsonarismo tem se mantido ativo ou mobilizado mesmo fora do governo? Há pautas específicas sendo trabalhadas? O Observatório tem notado alguma estratégia especial nas redes?

Almeida: Falando um pouco em cima da minha pesquisa. É uma das perguntas problema, o que será da direita, o que será do bolsonarismo. Um primeiro elemento é dividir a direita do bolsonarismo. O bolsonarismo é parte da direita, não representa toda a direita, e a sua eleição abriu uma janela de oportunidades para um segmento político. Bolsonaro inelegível ou preso não significa [o fim] do grupo. Isso abre uma janela de oportunidades para toda a direita. (…) Se a gente acha que a vitória do Lula significou a volta de um cordão sanitário da democracia em torno da direita, tá muito enganado. O jogo tá rodando ainda, e principalmente, não há só Bolsonaro agora. É a bola da vez, mas há outras figuras políticas que trabalham no campo da cultura [propagando conservadorismo] que estão ganhando muito espaço.

Edição: Cintia Alves

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Isadora Costa

6 Comentários

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    1. Exato, basta de anistias, contemporização, apaziguamento, medo. Chega da aplicação dessa lógica utilitarista ao Direito, transformando tudo em cálculo político, dessa avacalhação das regras. Vamos ficar esperando até quando para dar cumprimento à lei, o dia de São Nunca? Esperar Trump voltar ao poder nos EUA para que o golpe possa se consumar aqui? Garanto que se Alexandre de Moraes pagar pra ver, vai ter gente na esquerda defendendo que Lula indulte o maldito. Mas a contínua deturpação das normas nunca fará um sistema convergir para o equilíbrio.

      #respeitemeuvoto

  1. O BOM É DEIXAR ESSE CRIMINOSO SOLTO, DEPOIS DELE SER RESPONSÁVEL PELA MORTE DE 500 MIL BRASILEIROS NA COVID, PELO O QUE ELE FEZ COM O POVO YANOMAMI, POR ELE ATUAR CONTRAS AS INSTITUIÇÕES REPUBLICANAS.
    MÁRTIR PN.

  2. Vou orar pelo bolsonaro, pela esposa dele, pelos filhos deles, pelo malafaia. Vou orar com a força da freira do terça-livre. Vou orar para que eles sejam arrebatados, que subam aos céus num avião e fiquem por lá mesmo. Os arrebatados não viram mártires:”passam para o senhor”.

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