Tecnologia e a competitividade de nossa indústria

Tecnologia e a competitividade de nossa indústria

Por Daniel Klein

Sem forte esforço das empresas em pesquisa o Brasil não será capaz de competir

A recuperação da indústria brasileira e ganhos de sua competitividade no comércio internacional dependem de outras coisas além das políticas cambiais discutidas ontem pelo Nassif em seu post Os caminhos da política econômica de Joaquim Levy.

Desde o final da Segunda Guerra, quando teve início a criação da nossa indústria, seu principal suporte tem sido um protecionismo excessivo por meio de altíssimas tarifas alfandegárias. Com isso, nossa indústria nunca ficou exposta à competição internacional. Para atrair indústrias automobilísticas para o Brasil, JK garantiu para as empresas aqui instaladas uma verdadeira reserva de mercado. Políticas semelhantes têm sido aplicadas desde então, com intensidade variável, aos mais diversos setores industriais. A reserva de mercado foi imposta de forma explícita em um setor, o da informática, com resultados muito deletérios para toda a nossa economia.

Nossa tecnologia industrial está muito defasada em praticamente todos os setores. A construção civil no Brasil é quase toda baseada em estruturas de concreto, setor no qual nossa engenharia civil teve bom desenvolvimento. Entretanto a tecnologia da nossa indústria cimenteira é uma das mais atrasadas do mundo. Continuamos produzindo só cimento tipo Portland, produto criado no século XIX, enquanto ao largo do mundo são produzidos também outros tipos de cimento muito mais resistentes. E o nosso Portland é ruim, pior, por exemplo, do que o da Turquia. Como me disse pessoalmente o ex-ministro da C&T José Israel Vargas, o cimento brasileiro é bom para galinheiros.

Vez por outra, alguém diz que o Brasil não é capaz de desenvolver tecnologia. Mas em dois casos importantes em que o Brasil não encontrou tecnologia para importar – seguindo o preceito de Pedro Malan “Tecnologia é coisa que se compra” – o país demonstrou capacidade para desenvolvê-la.  Um deles é o desenvolvimento de tecnologias para uma agropecuária tropical. Desde a criação da Embrapa, em 1973 a nossa técnica agropecuária vem avançando com rapidez sem igual no mundo, o que tem resultado em vultosos superávits no comércio externo de produtos agrícolas. O outro caso é a tecnologia de extração de petróleo em águas profundas, setor em que somos líderes.

Em contraste com outros países que se desenvolveram tardiamente, como Coreia e China, o Brasil cede nosso mercado a empresas industriais multinacionais sem sequer exigir como contrapartida a internalização de parte da sua pesquisa tecnológica. Somos também muito falhos na imposição de normas técnica. Desde o governo Collor, o estabelecimento de normas técnicas industriais no Brasil é privilégio exclusivo da ABNT, uma associação privada dominada por indústrias estrangeiras. O sistema de normas técnicas no Brasil é tão permissivo que as indústrias multinacionais podem aqui fabricar seus produtos sem praticamente nenhuma adaptação às normas brasileiras. O Brasil é o país do mundo que produz o maior número de tipos de parafuso. Isso porque qualquer indústria estrangeira recém-instalada encomenda no mercado brasileiro exatamente os parafusos usados no seu país sede.

Diz-se com frequência que o Brasil desenvolveu o motor flex, como se esse motor fosse alguma maravilha técnica. O flex na verdade é um motor que não funciona com eficiência nem com gasolina nem com álcool. O resultado é que a eficiência dos nossos carros não acompanha os avanços que ocorrem no mundo. Recentemente, o governo ofereceu uma enorme desoneração à indústria automobilística sem exigir qualquer contrapartida tecnológica, como, por exemplo, a de desenvolver motores flex eficientes.

Quando, no finalzinho de 2003 o governo anunciou a PITCE, logo criou a ABDI, que seria a sua articuladora técnica. Luciano Coutinho foi colocado no BNDES com a incumbência de promover a pesquisa tecnológica das empresas. A PITCE sequer chegou a ser formulada adequadamente, a ABDI ficou sem o que fazer e o BNDES partiu para outros empreendimentos, o mais desastrado dos quais foi a criação das Campeãs Nacionais.  Os subsídios envolvidos nos empréstimos do BNDES talvez custem o dobro do Bolsa Família, mas isso não promove a tecnologia das nossas empresas.

O Brasil despende de 1,1% a 1,2% do Pib em CT&I. Desse gasto o governo entra com cerca de 0,8% e as empresas com o restante. Nos países líderes em tecnologia e inovação, os gastos em CT&I vão de 2,2% a 3,5% do Pib. Mas os gastos governamentais nunca ultrapassam 0,9%. Ou seja, o governo brasileiro despende fatia do Pib igual à desses países, mas neles as empresas gastam mais do que o dobro do despendido pelo governo.

Há outros fatores inibidores do esforço empresarial em pesquisa tecnológica. Esse é um tipo de investimento de retorno lento, e o custo do capital no Brasil só permite investimentos de retorno imediato. Além do mais, nunca se tem segurança sobre as futuras regras econômicas vigentes no Brasil, o que transforma em temeridade qualquer investimento de longo prazo. Um último fator, que praticamente impede a instalação de laboratórios de pesquisa no Brasil é o alto custo da mão de obra requerida. Um simpósio realizado pela Fapesp há alguns anos mostrou que o emprego de um pesquisador com doutorado em empresa no Brasil custa mais caro do que no Vale do Silício! Dado que a produtividade do pesquisador nos EUA é muito maior, por causa de todo o ambiente tecnológico, o problema é muito grave. A viabilização da pesquisa tecnológica empresarial no Brasil depende de forte desoneração do trabalho de pesquisa, além de outros incentivos governamentais. 

Redação

6 Comentários

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  1. O grande vacilo desse autor

    O grande vacilo desse autor foi deixar de lado um setor que dominamos como ninguém. Chama-se indústria dos concursos públicos.

    Temos nesse campo um time imbatível que vai de apostilas com 10.000 questões resolvidas a video aulas on-line que é uma coisa sensacional.

    Quem descobriu essa nobre tecnologia no momento certo ri de uma orelha até a outra devido a demanda crescente e incessante.

    Todos atrás de uma tetinha farta para mamar… E segundo relatos a coisa é realmente uma delícia. Semanas de trabalho ditas TQQ (terça, quarta e quinta), “saídas ao médico” às 15:00 horas, clima de total descontração com direito a modinha de viola no expediente… 

    Não sei como ainda não exportamos.

    1. Nao eh desse modo, pelo menos
      Nao eh desse modo, pelo menos nao eh realidade q vivencio.
      os funciinarios publicos tem de ser selecionados de algum modo e nao percebo outro mais adequado do q por meio de concurso publico.
      esse tqq pode se dar em alguns pontos muito especificcos, mas nao eh aregra

  2. tecnologia e a competitividade de nossa industria

    A questão do desenvolvimento da  tecnologia nos países em desenvolvimento, jamais, em tempo algum, pode ser comparado ao dos países centrais. Óbvio. Comparar com a meca da tecnologia então, nem pensar. 

    Precisamos ser mais realistas ao analisarmos o cenário tecnológico do Brasi ao longo do tempo.

    Recomendo para início de conversa, a leitura de um livro, escrito por um brasileiro que teve a indústria de pai no Brasil, massacrada pelas multinacionais. Trta-se de – A DITADURA DOS CARTEIS – de um brasileiro honrado e indignado com tal situação, o Sr. Kurt Rudolf Mirow, falecido precocemente aos 51 anos. Grande lutador, merece todo nosso respeito.

    Não se trata de choradeira inconsequente. Trata-se de nossa crua realidade.

    Outros países como a Coréia do Sul que na década de 70 era mais atrasada que o Brasil, conseguiram se superar, alcansando hoje, níveis tecnológicos am amplos setores da economia, comparável aos dos países centrais. No entanto, a história política da Coréia, é bem diferente da do Brasil.

    Para ficar, apenas, na superfície do tema, sem deixar de tocar em pontos cruciais, há que se reconhecer o seguinte:

    1- Enquanto os EUA em 4/7/1776 proclamava sua Independência,

    2- O Brasil, só iria proclamar a sua em 7/9/1822, 46 anos depois.

    3- O país passou a se desenvolvermenos precáriamente, com a vinda da corte em 1808.

    4- Enquanto os americanos davam preferência a seus produtos, aos importados da Ingleterra, o Brasil castigava quem ousasse inovar e produzir, havia uma RESERVA DE MERCADO DA CORTE, até 1808.

    5- O Brasil passou de colônia até 1822 a império até 1889, abolindo a escravatura, 23 anos depois dos americanos.

    6- Neste longo período de Brasil Colônia a Brasil Império, portanto, 389 anos, sempre fomos fonte de Riqueza para a Europa, que enquanto isto, tendo início de desenvolvimento, apenas, a partir de 1808, com a abertura dos portos, até então, a produção açucareira carro chefe da economia, ficava a cargo do senhor de engenho, comercializada, pelos portugueses.

    7- Enquanto isto, a europa Promovia a Revolução Industrial liderada pela Inglaterra 1776/1779- com boa ajuda de nossos recursos, atravessados pelos patrícios.

    8- Promovia a Revolução Francesa 1789/1799, estabelecendo novos padrôes aos Direitos do Homem e das relações sociais.

    9- Com a revolução Industrial, a Inglaterra despejava seus produtos indistriais em suas colônias e no Brasil.

    10- Com a dianteira econômica e tecnológica, esses países consolidaram sua hegemonia, sobre os demais ao longo do tempo, sem entrar no detalhe dos outros países, como Alemanha, Japão, Rússia, China, etc…

    Após a segunda Guerra mundial, os aliados, dividiram o mundo, em capitalista e comunista. Dividiram o Planeta geograficamente, conforme seus interesses capitalistas e comunistas.

    No período desenvolvimento capitalista dos países hegemônicos houve forte concentração de capital, que permitiu a formação de grandes empresas multinacionais que globalizaram o capitalismo. Empresas com sede nos países centrais e, filiais nas colônias.

    No mundo capitalista, para promoção do desenvolvimento e crescimento sustentado, há que se ter recursos financeiros, tecnologia, mão de obra treinada, mercado de consumo interno e externo, mas, acima de tudo recuros minerais, como petróleo e gás, alumínio, cobre, minério de ferro, macro e micro nutrientes pra composição de fertilizantes,  terras raras, etc..

    Onde conseguir os minerais, madeira nobre e outros matérias primas essenciais ao crescimento das mega corporações com crescimento teratológico, para abraçarem o mundo?

    Evidentemente, que os países mais atrasados tecnologica e socialmente menos desenvolvidos para o capitalismo, foram as fontes inesgotáveis desses recursos.

    E onde colocar os excedentes produzidos para intupir o mundo de produtos, muitas vezes supérfluos? Óbviamente, que nos países em desvantagens econômicas e tecnológicas e o Brasil se tornou uma grande reserva de mercado às multinacionais.

    Peço desculpas aos estudiosos do tema, pela superficialidade, mas minha pretensão é, apenas, concluir em sítese que:

    a- Com a consolidação dos domínios econômico, financeiro e tecnológico nas mãos de cerca de 8 países, ficou cada vez mais difícil, aos países do sul, ásia e áfrica, romperem as barreiras do, protecionismo econômico desses países centrais. 

    b- No Brasil, a mesma elite perversa que nos impediu de avançar por 500 anos, composta pelas multinacionais e pela elite política entreguista, tapeada e aparelhada pelas grandes corporações, dentro e fora de nossas Instituições, acreditam piamente, no papo furado da globalização compreendida, naquela, onde o Brasil:

    -entra com a matéria primas, importando produtos acabados, gerando empregos e divisas lá fora.

    -entra com mercado consumidor para os produtos acabados dos países centrais.

    -entra com mão-de-obra barata na montagem de produtos importados e na fabricação de alguns componentes internos, etc..

    Não bastasse tudo isto, agora querem fatiar a PETROBRÁS, tomar o pré-sal dos brasileiros, sangrar o país em dívidas com banqueiros externos e internos, enfim, subjugar um povo com potencial de grande desenviolvimento econômico e social.

    Se a elite interna tivesse apêgo e respeito aos brasileiros, ao povo da qual faz parte, investiria com mais coragem e empreendimento no longo prazo e não da-mão-pra-bôca ou, daqui para o HSBC, com vistas a ganhos astronômicos no curto prazo, quando não, por debaixo do pano.

    Este é o ponto, o pobre, o trabalhador, não tem recursos para investir em tecnologia, mas, a elite capitalizada é que tem de dar a resposta ao país. Se for menos entreguista, apoiará um programa com interesses nacionais legítimos, frente aos interesses exógenos.

    Como o Brasil, políticamente, sai de um golpe e entra noutro, com uma elite acostumada a confundir o público com o privado, quando o povo elege nas urnas líderes que vêm das bases do povo, esta elíte fica inconformada, revoltada, odiosa e sua fúria golpista, se manifesta em todas as mídias com força e intenção visível de Golpe de Estado.

    Creio que esses podem ser, aguns dos motivos de não termos avançado em tecnologia, sem intenção de rigor histórico ou econômico, mas, com rigor crítico necessário para tentar tirar o véu da hipocrisia, nos debates de temas tão relevantes ao país.

     

     

     

     

    1. A única razão histórica que

      A única razão histórica que importa saber é o fato da nossa elite ser, desde sempre, formada majoritáriamente por proprietários de terra; gente mais afeita a leis e burocracia do que a ciência e tecnologia. Coisa só importante para elites que nascem do comércio e da indústria.

      O ponto de causa e efeito é que essa elite preferiu a muito tempo entregar nossa indústria aos estrangeiros ao invés de se transformar ela própria em elite industrial. Disso criou-se uma barreira onde uma elite industrial, genuinamente nossa, pudesse ganhar corpo. E assim ficamos nesse eterno atrofismo tecnológico onde apenas iniciativas setoriais e especificas conseguem despontar.

  3. Burocracia e etc.

    Para cada empreendedor novo existe uma malta a ser alimentada. A começar pelas dificuldades para se abrir negócios no Brasil.  O mercado interno era muito restrito e não permitia rápido retorno do capital investido.  Agora as coisas começaram a mudar, mas pelo jeito eles querem ferrar o mercado interno novamente.  Haja vista as demissões em massa em função da porraloquice de alguns cavaleiros negros.  Nós sempre somos os últimos a fabricar e fornecer ao nosso mercado internos as novidades que se desenvolvem no extranjeiro.  Há casos simbólicos, como os aparelhos de ar condicionado split.  Estes existem em quase todo o mundo há muito tempo.  Só recentemente fomos abandonar aquela caixa pregada na parede, os antigos aparelhos.   Em termos de construção civil o Brasil precisa visitar a China para ver como estão fabricando banheiros modernos com tudo em um pacote só.  O uso de novos materiais é uma realidade, onde nós ainda estamos usando maderira e alvenaria.   Até no futebol nós estamos ficando para traz.  Com a eminente falência da Globo, nem sequer uma Hollywood trpical nós temos para massificar nossa produção cultural.  Enqunto isto a China está montando uma “Hollywood”  em Shanghai, maes moderna do que a Hollywood de LA.

    Nós ainda usamos cobradores em nossos ônibus e há quem defenda isto como se fosse a defesa de emprego de trabalhadores.  Somos capazes de institucionalizar flanelinhas achacadores com o nome de “guardador autônomo”. Ninguem se pergunta se seria mais fácil automatizar tudo isto e colocar este povo num programa de bolsa até que eles se capacitassem a fazer outra coisa na vida. Eles continuariam ganhando mas pelo menos no emperrariam mais a modernizaçao do país.  Sairia mais barato para todos. 

    Devemos dar graças a deus por termos sol, água e terra, pelo menos por agora, o que nos permite exportar alimentos.  Mesmo aqui, a mecanização da agricultura é um parto a fórceps.  

    Mas eu ainda acredito que em 100 anos estaremos melhor.

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