Ministério da Economia nega que o Brasil esteja quebrado, mas não explica denúncias

Entre as colocações, a pasta de Guedes informa que o endividamento interno está em queda e que o superávit primário foi de R$ 23,4 bilhões.

Fachada do Ministério da Economia. Foto: Agência Brasil

Ao longo da última semana, o coordenador dos grupos de transição (GT) do governo Lula 3, Aloizio Mercadante (PT), reafirmou diversas vezes que o Brasil está quebrado. Isso porque, de acordo com as conclusões de várias equipes que avaliam as condições dos ministérios, há falta de verbas para diversos segmentos, além de paralisação de atividades também por falta de recursos.

Por meio de nota à imprensa, o Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes, rebateu a colocação de Mercadante, afirmando que se trata de uma “série de declarações infundadas sobre o atual cenário econômico”.

Entre as colocações, a pasta de Guedes informa que o endividamento interno está em queda, o superávit primário foi de R$ 23,4 bilhões, que as dívidas com organismos e instituições financeiras internacionais somam R$ 1,23 bilhão, que os servidores públicos do Executivo contarão com 5% de correção salarial no orçamento do próximo ano, alta nominal de 7,4% no salário mínimo e que o programa Governo Digital terá R$ 142 milhões no Projeto de Lei Orçamentária em 2023, valor 105% maior que o destinado em 2021 e 53% maior que o previsto para 2022.

Perguntas que não querem calar

O que a nota do Ministério da Economia não explica, no entanto, é em relação à série de denúncias feitas em diversas pastas. Por exemplo: em relação à dívida com órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização Mundial do Comércio (OMC), o valor soma R$ 5 bilhões.

No total, são 43 entidades com as quais o Brasil tem pendências financeiras, entre elas o Tribunal de Haia, em que o País responde por quase 50% dos valores a receber, totalizando 10 milhões de euros atrasados. De onde vem, então, a diferença de valores?

De acordo com Mercadante, todos os dados apresentados pelos GTs são auditáveis. Já sobre o governo atual, o ex-ministro reclamou ter encontrado dificuldade no acesso a dados e documentos de vários ministérios.

Da parte do governo, houve apenas a informação de que o montante devido a órgãos internacionais não ultrapassa R$ 1,23 bilhão, sem detalhamento sobre os credores e o valor em atraso com cada instituição.

Gastos não explicados

Contar com verba no Orçamento também que não dizer, necessariamente, que tais recursos foram empregados no custeio de atividades prioritárias de cada gabinete. Se o governo destinou R$ 75,2 milhões ao programa Governo Digital, por que ele está em vias de ser paralisado ainda este ano, uma vez que os contratos de manutenção do sistema não foram pagos, como apontou o GT de Planejamento, Orçamento e Gestão?

Outro exemplo de que contar com dinheiro em um gabinete não quer dizer que ele será empregado com responsabilidade veio do GT de Direitos Humanos. De acordo com a equipe, existe um contrato de R$ 172 milhões referente a compra de bebedouros e pagamento de locação de guindastes. Ambas as atividades são desenvolvidas pela mesma empresa. Não há sinal de quais bebedouros foram comprados por meio deste contrato, mas seriam milhares, tendo em vista que um bebedouro custa, em média, R$ 500. Porém, o mais curioso deste contrato, que já foi encaminhado ao Tribunal de Contas da União (TCU), é o emprego de guindastes em um gabinete que nada tem a ver com qualquer tipo de atividade da área da construção civil.

Paralisações iminentes

Além do Governo Digital, outras atividades em diversos ministérios também correm risco de paralisação ou até já suspenderam o atendimento ao público. Foi o caso da Polícia Federal, que só vai emitir passaportes dos cidadãos atendidos até o final de novembro. Se qualquer outro brasileiro precisar do documento para viajar ao exterior, simplesmente não vai conseguir agendar o atendimento nos postos da PF, uma vez que a instituição precisa da liberação de R$ 74 milhões para reestabelecer plenamente o serviço.

Os servidores do Ibama, de acordo com o GT de Meio Ambiente, também estão trabalhando em casa por conta da falta de recursos e de estrutura. Os reitores de universidades e institutos federais admitiram a possibilidade de suspender atividades, já que os sucessivos bloqueios ao Ministério da Educação (MEC) minaram as verbas essenciais para a manutenção dos serviços terceirizados.

Funcionamento à base de denúncias

Os bloqueios do MEC ameaçaram ainda o pagamento do salário de mais de 200 mil bolsistas do mestrado, doutorados e pós-doutorado, além de 14 mil estudantes de medicina residentes. Além de não contarem com reajuste salarial desde 2013, os estudantes só conseguiram receber a bolsa porque o GT de Educação denunciou o atraso do pagamento, na última terça-feira (6). Apenas depois da denúncia de Mercadante em uma coletiva de imprensa é que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) veio a público, no Instagram, admitir o atraso.

Mas a denúncia da equipe de transição da Educação ainda não teve efeito sobre a liberação de recursos para garantir a produção de livros didáticos para o ano letivo de 2023, situação ressaltada pelo GT e por Mercadante ao longo da última semana, mas ainda sem resolução. O que a equipe já sabia era que a pasta precisa de R$ 1,8 bilhões para finalizar todas as atividades do ano.

Ações de fim de governo

Mas ainda que o Ministério da Economia se preocupe, nesta altura do campeonato, em explicar dados do governo que neguem a situação caótica em que se encontra o País, faltou explicar a necessidade de destinar R$ 5 bilhões à compra de tanques de guerra blindados para o Exército. A compra foi suspensa pela Justiça, que entendeu falta de bom senso do governo, uma vez que não “tem sentido comprar armas em tempo de paz, enquanto se faz cortes de verbas nas áreas de educação e saúde”. Assim, parece que até o judiciário tem mais ciência sobre a real situação econômica do País do que a pasta chefiada por Paulo Guedes.

Enquanto isso, os ministérios de Desenvolvimento Regional, Cidades e Assistência Social contariam com recursos suficientes para funcionar, no máximo, até dia 10 de janeiro, de acordo com o déficit previsto no orçamento de 2023. Apenas com recursos da PEC da Transição é que as pastas vão conseguir manter as atividades ao longo do ano. Já no caso do Ministério do Meio Ambiente, a estratégia será buscar recursos de fundos internacionais e retomar parcerias, a fim de garantir o capital para recuperar parte da Amazônia.

Vale ressaltar ainda que tanto a Defesa Civil quanto o Ministério das Cidades não têm, juntos, R$ 6 milhões para destinar às obras de prevenção e atendimento às vítimas de desastres naturais. Enquanto a primeira conta com R$ 3 milhões no próximo ano, a segunda dispões de menos ainda: R$ 2,7 milhões. A esperança de contar com mais recursos está, mais uma vez, na aprovação da PEC, que nos próximos dias será avaliada pela Câmara dos Deputados.

LEIA MAIS

Camila Bezerra

Jornalista

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador