Transparência jateada, por Carol Proner

A decisão de Dias Toffoli, determinando a investigação da ONG Transparência Internacional, vai na linha do que já fizeram outros países

Acervo STF

no Brasil 247

Transparência jateada, por Carol Proner

O Brasil tem direito de rever os métodos da Operação Lava Jato com forma de fazer justiça a empresas, empregos e ao desenvolvimento nacional profundamente prejudicado. Com o fim de aperfeiçoar o combate à corrupção, o país tem o dever, por meio das instituições democráticas, de reavaliar e ponderar os esquemas da Lava Jato e seus efeitos lesivos.
 
Considerada pelo Ministro do STF, Gilmar Mendes, como sendo a maior fraude jurídica da História, a responsabilização e a reparação de direitos violados são imperativos para evitar que a constrangedora farsa se repita.
 
É preciso responsabilizar não apenas o famoso ex-juiz e os histriônicos procuradores de Curitiba, mas todos os que atuaram nas laterais da operação para garantir que prosperassem fake news a engajar a opinião pública e a instalar uma cultura autoritária de flexibilização das garantias e desrespeito ao devido processo legal.
 
A recente decisão do Ministro Dias Toffoli, determinando a investigação da ONG Transparência Internacional por sua atuação na Lava Jato, vai na linha do que já fizeram outros países, que também questionaram a indevida ingerência de entidades em assuntos de jurisdição nacional para solver problemas de transparência e governança.  
 
Por aqui, até mesmo a Fundação Getúlio Vargas notificou a entidade em sua sede, na Alemanha, acusando a seção brasileira de ter usado mão de obra, expertise e instalações da própria FGV para cumprir memorando firmado com a Lava Jato sem o seu consentimento. Atualmente surgem novas denúncias a questionar a ONG pela falta de isenção e pela opacidade de seus interesses.
 
Entre advogados e especialistas em direito o estranhamento vem de longe. Juristas pela democracia imediatamente questionaram a motivação da entidade, tanto pela colaboração formal escolhida arbitrariamente, como pela exagerada propaganda e dedicação da ONG em promover a Lava Jato no exterior, incluindo prêmios autoatribuídos ou criados sob medida para legitimar a atuação dos procuradores e do juiz herói.
 
Revisitei um artigo que escrevi há 4 anos, publicado no dia 15 de setembro de 2020, com o título: “A ONG Transparência Internacional e a obscura parceria com a Lava Jato”. O texto circulou em diversos portais de notícia e foi escrito quando estávamos às voltas com as revelações da chamada Vaza Jato, quando a Agência Pública e o The Intercept Brasil trouxeram a público as mensagens trocadas entre o procurador Deltan Dallagnol e o diretor-executivo da sede brasileira da ONG Transparência Internacional, Bruno Brandão, sugerindo uma proximidade “pouco transparente” da organização com a Operação Lava Jato. 
 
Os chats, mais tarde reunidos no material da Operação Spoofing da Polícia Federal, mostraram que Deltan Dallagnol tinha relação próxima e frequente com Bruno Brandão e que recorria a ele quando a imagem da operação estava em perigo ou quando precisava promovê-la. A Transparência Internacional chegou a ter acesso ao contrato assinado entre a Força-Tarefa e a Petrobras para a criação da malfadada Fundação da Lava Jato, e mais, fez sugestões ao chefe da Força-Tarefa sobre a minuta do contrato.
 
No artigo de 2020 mencionei que achava irônico que a entidade tivesse recomendado a Deltan Dallagnol que o Ministério Público Federal não formasse parte do conselho da bilionária Fundação, a ser criada com o dinheiro das multas recolhidas do acordo de leniência da Petrobras. Irônico e trágico para o Procurador, que não deu ouvidos e insistiu em ser o Presidente da nova ONG, privada, mas formada com dinheiro público, e então viu seus planos desmoronarem.
 
Os dez argumentos que usei há quatro anos para fundamentar a desconfiança com a Transparência Internacional seguem intactos e vou repeti-los:

1- Porque a Transparência Internacional é uma entidade com credibilidade mundial no combate à corrupção, estando presente, por meio de agências, em ao menos 100 países;

2- Porque a Transparência Internacional sempre tomou partido acriticamente pela Lava Jato e atuou nos últimos anos para defender publicamente a operação e seus protagonistas dentro e fora do Brasil, por meio de entrevistas, contatos com a imprensa e publicação de notas de apoio;

3- Porque, e basta procurar em fontes abertas, o então presidente da Transparência Internacional, o peruano José Carlos Ugaz, visitou o ex-juiz Sergio Moro em 2016, esteve na sede do jornal Gazeta do Povo, falou com os procuradores da Lava Jato e outras entidades e, em discursos e publicações, estimulou o prosseguimento das investigações contra as empreiteiras do país, pois seguramente estariam envolvidas em corrupção;

4- Porque a organização Transparência Internacional concedeu, ainda em 2016, no Panamá, o “Prêmio contra a Corrupção 2016” à Força-Tarefa da Operação Lava Jato, ressaltando que “começou como uma investigação local sobre lavagem de dinheiro e se transformou na maior investigação que expôs casos de corrupção no Brasil até o momento”;

5- Porque Transparência Internacional, imiscuindo-se em temas de política interna, chegou a fazer campanha em sua página web para que o Conselho de Controle sobre Atividades Financeiras, o COAF, ficasse sob controle do ex-juiz e, naquela ocasião Ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, no lugar de ir ao Ministério da Economia – e isso só para mencionar uma das interferências da ONG em assuntos do Brasil, mas são inúmeras, como se pode ver na página da entidade;

6- Porque, e não deixa de ser impressionante a fidelidade da ONG estrangeira a Sérgio Moro, a Transparência Internacional fez nota pública para defender a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça por ocasião da troca de comando na Polícia Federal;

7- Porque tudo isso levanta um imenso alerta a respeito dessas ONGs com nomes insuspeitos e suas verdadeiras intenções em relação ao nosso país;

8- E ainda, porque espantosamente e ignorando tudo que já se sabe sobre a operação Lava Jato, o Ministro do STF Luiz Edson Fachin havia feito, no contexto da Vaza Jato, um relatório ao novo Presidente da Corte defendendo que o trabalho da Lava Jato é pautado pela legalidade;

9- Porque devemos entender, e já são fartas as informações que comprovam, que sob pretexto de combater a corrupção, setores do poder judiciário, do Ministério Público, aliados a meios de comunicação e agências internacionais promoveram o uso do direito com o objetivo de desestabilizar o país política e economicamente;

10- Por fim, porque já passa da hora de tratar a corrupção como um problema sério, recorrente, afeto a qualquer governo, que deve ser combatida permanentemente e com rigor, mas dentro da lei e assegurando garantias para não destruir projetos de vida, biografias, empresas e interesses nacionais.
 
Aos dez argumentos somam-se muitos outros durante os últimos anos. Menciono apenas o mais recente, o fato de que a entidade segue ativa e se sente habilitada – com ecos da mídia de plantão – a julgar a percepção da corrupção no Brasil mesmo os dados estão em dissonância com os relatórios e pareceres de entidades de controle nacional. Refiro-me ao recém-divulgado Índice de Percepção da Corrupção – IPC que diminui a posição do país em 10 pontos no ranking.
 
Estudos mostram que os prejuízos advindos da Lava Jato para o setor da construção civil e para a produção de óleo e gás foram bilionários.  O Brasil perdeu a chance de fazer o bom combate à corrupção e de sanar um problema histórico e sistêmico sem prejudicar o desenvolvimento e os planos econômicos de cara ao futuro.
 
Poderíamos ter feito tudo isso dignificando o papel do Ministério Público e valorizando um judiciário consequente com a preservação das empresas e dos empregos. O que se viu foi uma tremenda falta de estratégia de defesa nacional e, como uma lição bem aprendida, ao menos agora sabemos que defender a estabilidade econômica também passa por cuidar da forma, dos métodos e das garantias jurídicas.

Carol Proner – Advogada, Professora da UFRJ, fundadora da ABJD, especialista em temas de lawfare político e econômico.
 
O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

Redação

8 Comentários

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  1. Sobre a ONG Transparency International gostaria de comentar com foco em Mani Pulite e na Opus Dei. —- Transformar ódio à corrupção em ódio à política progressista do PT não é tarefa para influencer ou apresentador de TV, é tarefa para centros de psicologia aplicada e de engenharia social. Para alguns analistas foi a partir de 2010/11 que deram início à pauta da anti-corrupção e desgaste do governo Dilma; chegaram à baixeza – impensável – de distribuir adesivo pornografico sugerindo o estupro da Presidenta, ofendendo a Mandatária e milhões de brasileiras e brasileiros. Suportamos até a falta de respeito do representante da Real Família Britanica na pessoa do merda Alex Ellis: “Ela (Dilma) tem problemas para mostrar sua cara por causa do botox”. O general Colin Powell chegou a declarar oficialmente que as ONGs eram multiplicadores de força e parte importante das forças de combate do seu país. No Brasil não há restrições às operações destas organizações e muitas operam com a embaixada e operadores da USAID. São forças implantadas e prontas para serem acionadas.

  2. Para quem não sabe, Powell foi o covarde que fez carreira por saber mentir e acobertar atrocidades: distinguiu-se em 1963 incendiando palhoças de famílias camponesas vietnamitas indefesas para dissuadi-las de proteger vietcongs; negou – com cinismo – o massacre de My Lai em 1968, e terminou a carreira agitando um frasquinho de pó de arroz na ONU em 1991, depois de ter arrasado inteiros quarteirões pobres da cidade de Panamá em 1989. Na declaração Colin ficou claro que o centro do poder adotara o sistema ONG para substituir o público com o privado, até mesmo nas relações internacionais: SAI o político “moderador” ENTRA o político “manager” dando soco e pontapé na ordem social, comercial e constitucional.

  3. Pessoalmente acho que foi a partir de 1981 com o operário Lula reivindicando participação direta da classe trabalhadora na vida política do país, que a Casa Grande retoma o programa de subversão. A ridícula Regina tô-com-medo Duarte ocupou em 2002 o lugar que foi do calhorda Mário trezentos-mil Amato em 1989. Sempre em 2002 o The Washington Times publica o artigo “Blocking a New Axis of Evil?” do Constantine C. Mengues, do Hudson Institute e já nos primeiros meses do governo Lula o correspondente do New York Times, Larry Rother, um coglione do time do “merdalha” Reinaldo Azevedo, escreve o longo artigo difamatório “Lula Cachaça”: “Uma crise atrás da outra, escândalos de corrupção, fracasso de programas sociais cruciais; o cachaceiro sempre “alto” não pode trabalhar, etc.”. Os artigos do WT e NYT provinham da mesma central: Harvard, canal inaugurado pelo Lincoln Gordon. O Departamento de Psicologia de Harvard e o Harvard Law School, centros que operam com cobertura da CIA (adestraram Moro e Dellagnol), planificaram o que vimos a partir de junho de 2013. A mídia e outros atores da extrema direita agiram segundo um programa bem articulado para indispor a sociedade contra os poderes instituídos, passar a ideia que todos eram corruptos, desacreditar o governo, atiçar ódio social/religioso e consolidar o extremismo ideológico, hoje com mais de 334 células neonazistas ativas em todo o território nacional.

  4. GGN, outubro de 2015: “Considerações sobre a Operação Mani Pulite, di autoria de Sérgio Moro é o melhor preâmbulo até agora escrito para a Operação Lava Jato. Em sete páginas, Moro analisa Mani Pulite e escreve um manual de como montar operação similar no Brasil”. —- Discordo quanto à paternidade do texto; se foi bem escrito não pode ser do juizeco nem da sua “conge”. —- A agência de investigações estadunidense Kroll era presente em Milão quando o então chefe da CIA, James Woolsey, fez saber que o governo Clinton recolhera volumoso dossier e insinuou que podia “jogar merda no ventilador” quando quisesse. —- Detalhe: a embaixadora dos Estados Unidos no Brasil, Donna Hrinak, despediu-se de Brasília para ser assessora qualificata da Kroll, empresa que operou para o fundo Opportunity, um dos braços financeiros importantes do processo de privatização no Brasil, associado ao Citybank na farra dos anos 90. Como o artigo do GGN reconheceu, a Lava Jato foi operação de guerra. Na Itália foi um golpe judiciário para abater uma classe política corrupta que governava mas não cedia assets estratégicos e patrimoniais.

  5. Fontes confirmam que Bettino Craxi sabia que magistrados sabiam dos financiamentos ilícitos. Francesco Cossiga, homem de Gladio, insuspeito “americano”, reconhecera a participação da CIA em Mani Pulite. Para Giuliano Urbani, ex ministro de Berlusconi, Di Pietro foi instrumento da CIA contra Craxi, Spadolini e Andreotti. Mani Pulite teve início logo após o famoso encontro no Royal Yatch Britannia em 1992 com a bordo a fina flor da finança mundial reunida ao largo de Civitavecchia com a parte italiana liderada por Mário Draghi. Programa: vender e desmantelar o que sobrasse do sistema produtivo italiano. Nesse grupo era presente o palhaço Beppe Grillo, escolhido para atuar na manipulação político/ideológica: SAI político corrupto, ENTRA lesa pátria corrupto. Foi o início de um programa piloto pre-estabelecido e bem articulado. Berlusconi foi exemplo sem igual na Europa. Segundo o francês Guy Hermet, a única semelhança digna de nota foi o Collor com a rede Globo, na América Latina. Di Pietro abandona a toga e funda o partido “Itália dei Valori” com apenas 3% dos votos nas eleições que se seguiram, partido cavalo de troia que servia para Berlusconi comprar parlamentares na hora do aperto.

  6. Como Moro, Di Pietro conduziu o golpe judiciário seguindo ordens. Suas viagens aos Estados Unidos e suas estreitíssimas relações com Michael Ledeen avalam essa tese. Ledeen é expoente do think-tank American Enterprise Institute AIE, que muitos reconhecem como reservatório de ódio. – “O governo dos Estados Unidos é do lado bom, quem negar, é do lado mau” – esse é o mote do AIE, centro orientado no apoio incondicional de Israel e na perseguição implacável das esquerdas. Ledeen é um desabusado fascista de extrema direita. Serviu ao Reagan e ao Bush. Seu nome comparece em escândalos, atentados e despistagens (Aldo Moro, general Dozier, estação de Bologna, atentado ao Papa João Paulo II, armas de destruição de massa do Saddan, etc.); membro da Loja maçônica P2, a mais importante da Itália; conselheiro dos governos italianos nos anos 70 e 80 (foi também conselheiro do governo Matteo Renzi !). É um ativista tão perigoso que o então chefe do serviço de inteligência, Fulvio Martini, revelou quinze anos depois aos membros de uma CPI de ter dito em 1984 ao então embaixador estadunidense Maxwell Raab: “Ledeen é indesejável e não deve voltar à Itália”.

  7. Tom Wolfe no ensaio From Bauhaus to Our House, exalta o poder educativo da arquitetura e da urbanistica, reclama maior atenção aos modelos do passado para re-humanizar um espaço que segundo ele, exerce muita influência sobre os sentimentos humanos: edifícios, pontes, arcos, muralhas, logradouros, são – foram – edificados para desafiar o tempo, símbolos de identidade, de potência das ideias, de credos, de visão do mundo numa determinada época. Com o triunfo desmedido da governance globalizada, a cidade passou a ser remodelada (smart city) para uso e domínio de oligarquias transnacionais desprendidas de humanidade e cultura: espaços idênticos (como um hambúrguer, não importa onde), habitantes cretinizados na banalização da cultura, do entretenimento, da praxe alimentar e até sexual. Na Europa chama-se Eurocities: programas pensados para formatar experiências e reduzir cidades em Parque temático. O IESE Cities in Motion Strategies é uma plataforma de estudo lançada pelo Departamento de Estratégia da IESE Business School da Universidade de Navarra em mixórdia com Opus Dei. O escopo oficial é fomentar modelo de cidade que inclua inovação de governance com base a dois indicadores: direitos humanos e índice de percepção da corrupção (sic).

  8. Para inovar a governance escolheram a Transparency International, ONG da galáxia Soros, financiada entre outros pelo Departamento de Estado norte-americano, Foreign Office britânico e os Rothschild. Segundo o insuspeito jornal Valor Econômico, São Paulo foi escolhida para ser a primeira cidade fora da Espanha a receber programas de MBA Executivo da IESE. Um deles versa sobre alta gestão para a área de mídia e entretenimento !! Ou seja, orientar e conduzir o aparato de comunicação e produção cultural monopolizado por corruptos e golpistas. No Brasil o IESE atua desde 1996 através da escola de administração ISE. Na direção figura gente da laia do Ives Gandra (também consulente jurídico do falido golpe do 8 de janeiro). Como escreveu um nosso analista político, “ainda nos resta um antídoto à esta ofensiva: ampliar o espaço da liberdade cultural, da comunicação e da democracia no país. Isto se faz com políticas públicas, que assegurem a diversidade indispensável à criatividade do espírito e à livre formação do discernimento social. Se não contarmos as nossa próprias histórias, quem o fará por nós? Eles”.

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