Sexta Turma do STJ devolve direitos políticos retirados de cacique Xukuru

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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O processo que condenou o cacique Marcos Xukuru foi reconhecido como falho pelos ministros do STJ. A liderança foi vítima de erro judiciário

Cacique Marcos Xukuru perdeu os direitos políticos por conta da condenação e agora vê a possibilidade de recuperá-los. Foto: Tiago Miotto/Cimi

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu um recurso que reconheceu o cacique Marcos Xukuru como vítima de erro judiciário em processo criminal que terminou com a perda dos direitos políticos da liderança indígena. Em decisão nesta terça-feira (3), a Sexta Turma considerou a sentença proferida falha ao utilizar depoimentos de pessoas com interesse na condenação. 

Para os ministros, a sentença não considerou provas da inocência do cacique, liderança do povo Xukuru do Ororubá, cuja Terra Indígena está localizada no município de Pesqueira, no agreste de Pernambuco. Nela está a Vila de Cimbres, a qual o cacique é acusado de ter provocado incêndio criminoso. 

Em 2003, um conflito se deflagrou na Terra Indígena após o próprio cacique ter sofrido um atentado, que deixou dois indígenas mortos. Escondido, após escapar do ataque, o povo Xukuru acreditou que o cacique estava morto e a Vila de Cimbres se converteu no palco de um conflito entre os indígenas e os invasores do território tradicional. 

O caso do cacique Marcos Xukuru ganhou destaque porque ele se soma a toda sorte de violências sofridas pelo povo Xukuru na busca pela demarcação do território, tendo como ponto alto o assassinato do cacique Xikão Xukuru, em 1998, pai de Marcos. 

Em março de 2018, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condenou o Brasil por violação aos direitos dos índios Xukuru à propriedade coletiva e à garantia e proteção judicial.

O tribunal internacional concluiu que o Brasil não atuou em “prazo razoável” para demarcar o território Xucuru, em Pernambuco, afastando da terra as 2.300 famílias que formam a etnia, atualmente distribuídas em 24 comunidades. Isso promoveu conflitos, como o usado para incriminar o cacique Marcos.

O governo brasileiro demorou 16 anos, entre 1989 e 2005, para reconhecer a titularidade e demarcar as terras dos Xukuru, além de ter se atrasado para retirar invasores do território.

Elementos da inocência 

Durante o processo, aponta a defesa do cacique, foram apresentados diversos elementos que apontavam para a sua inocência, mas que foram ignorados pelas instâncias judiciais nas quais o processo tramitou. 

Quanto aos depoimentos usados contra o cacique, estes foram considerados suspeitos e “não deveriam ter sido utilizados como prova para a condenação”, entendeu a Sexta Turma. Além disso, o tribunal também destacou a falta de análise de provas que comprovam a inocência do cacique.

Em face da decisão anterior, o cacique Marcos, eleito prefeito de Pesqueira, em 2020, com quase 18 mil dos 34 mil votos válidos, foi impedido de tomar posse e convive com a impossibilidade de representar a população do município, tendo os seus direitos políticos cerceados. 

Cotado a cargos federais

Ele chegou a ser cotado para ocupar cargo no Ministério dos Povos Indígenas e também na Fundação Nacional do Índio (Funai), quando notícias deram conta, durante o governo de transição, de que o cacique poderia ser indicado a presidente do órgão indigenista, mas com os direitos políticos cassados, todas as possibilidades foram abortadas. 

A decisão do STJ, assim que tiver o acórdão publicado, estabelece a normalidade na vida da liderança indígena e a retomada de seus direitos políticos, podendo novamente concorrer a cargos eletivos no Poder Público.  

Para o cacique, “a decisão do STJ é um marco importante na luta pela justiça e pela garantia dos direitos dos povos indígenas. Não se trata de um caso isolado, infelizmente, muitos indígenas sofrem com a falta de acesso a uma justiça imparcial e acabam sendo condenados injustamente”. 

Em seu entendimento, a decisão do tribunal mostra que é possível reverter essas injustiças e garantir que os direitos dos indígenas sejam cada vez mais respeitados.

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Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

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