Em pleno Dia Internacional dos Povos Indígenas, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado Federal analisa nesta quarta-feira (9) o Projeto de Lei (PL 2903/2023), aprovado na Câmara Federal, que estabelece o marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
Nesta terça (8), a senadora ruralista Soraya Thronicke (Podemos-MS), que integra a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), apresentou relatório favorável à Comissão. A senadora afirmou que tem conversado com o governo federal e lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) trata do assunto.
“Apresentei o relatório pela aprovação do PL 2903/2023 como veio da Câmara. O marco temporal ainda será analisado sobre a questão jurídica na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), e depois deve ser debatido com todos os senadores em Plenário”, destacou a senadora.
Soraya tratou de usar o falso argumento de que o marco temporal tem base constitucional e, por isso, acredita que sua aprovação vai trazer segurança jurídica a todos. Não há na Constituição qualquer artigo que embase o marco temporal: a Carta afirma que o direito indígena à terra é originário.
Insegurança jurídica = marco temporal
A senadora entende que o PL aprovado na Câmara trará segurança jurídica tanto aos latifundiários quanto aos povos indígenas. Não há informação que sustente a certeza de Soraya. Ao contrário, o que há de pesquisas indica que o marco temporal intensificará a insegurança e os conflitos.
No estado do Paraná, de acordo com levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul, 36 aldeias podem ser afetadas caso a tese seja aprovada. O número representa 68% de todas as 53 comunidades existentes no Paraná, atingindo os povos Guarani, Kaingang e, sobretudo, o Xetá.
O STF, por sua vez, deve retomar em breve a votação do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, que trata das demarcações de terras e teve repercussão geral reconhecida pela Corte. Isso significa que a decisão tomada neste julgamento terá consequências para todos os povos indígenas do Brasil.
Até o momento, os ministros Alexandre Moraes e o relator Edson Fachin votaram contra o marco temporal.
O ministro Nunes Marques votou a favor da tese restritiva e o ministro André Mendonça pediu vista, sendo que regimentalmente ele possui até o final deste mês para autorizar a retomada da votação.
Prova diabólica
A subprocuradora da República Raquel Dodge falou ao jornalista Luis Nassif, na TVGGN, a respeito do marco temporal, na ocasião em que a votação havia sido retomada pelo STF, no começo de junho, e suspensa, após voto do ministro Alexandre Moraes, por um pedido de vistas do ministro André Mendonça.
“No Direito, a gente chama de prova diabólica, aquela impossível de ser feita. Como é que os indígenas vão provar, sob os moldes não-indígenas, que estavam na posse daquela terra no dia 5 de outubro? Será que nós exigiremos testemunhas de cartório?”, disse Dodge.
Para Dodge, a proposta é uma “inversão” de valores que “leva a um retrocesso”, pois a própria Constituição de 1988 garantiu os direitos dos povos originários sobre as terras que ocupam, e estipulou prazo para a União cumprir o dever de “dar segurança jurídica e dizer para os indígenas quais as terras são deles”.
Autora de um dos pareceres que estão em discussão no STF, Dodge ainda apontou que o julgamento terá repercussão geral e poderá atingir 800 povos indígenas em todo o País.
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